respublica

quarta-feira, março 31, 2004

É RELATIVO, Sr. ENGENHEIRO...

“(...) António Guterres afirmou que "combater o terrorismo violando os direitos humanos é fazer o jogo do terrorismo". (...) Foi por isso que se declarou esperançado na vitória do candidato democrata, John Kerry, para dessa forma levar adiante "uma grande coligação capaz de mobilizar desde os democratas norte-americanos até ao terceiro mundo" onde teriam de estar incluídos o presidente brasileiro, Lula, e "a própria China".” (in Público, 29 de Março)

Claro, todos sabemos que a China respeita os direitos humanos…




MANN O meu amigo João Ricardo, dos Meninos de Ouro, ficou feliz por saber que eu e a Gabriela partilhamos os seus gostos Mannianos. Os gostos musicais, literários e cinematográficos dizem muito sobre a personalidade de alguém. O facto de partilharmos o gosto por um filme tão “humano” (não encontro outro termo para o definir) como “Magnólia”, e por um som tão doce como o de Aimee Mann, mostra-nos que, tal como na “vida real”, as amizades na blogosfera surgem quando se têm em comum gostos e interesses.

sábado, março 27, 2004

SIMPATIA a GS diz que estou enganado, porque há alturas em que ela nada deve à simpatia. Cara Gabriela (?), quem se comove com a frágil humanidade das personagens de "Magnolia" e gosta de ouvir Aimee Mann só pode ser boa pessoa. Ainda que, como toda a gente, tenha os seus bons e maus momentos.

sexta-feira, março 26, 2004

NOVAS LIGAÇÕES inseri links para a simpática Cravo e Canela, para o Baltazar, para o Estrago da Nação (que possui uma série de interessantes blogs "satélites" dedicados às questões ambientais - atenção Jorge!), para o Cruzes Canhoto e para o Cibertúlia.




A ORIGEM DO TERROR Na sua crónica no Público de hoje, Miguel Sousa Tavares (MST) escreve o seguinte:

"(...) Há, pois, outro caminho. E esse caminho não é ir ao Afeganistão convidar Bin Laden a sair da gruta e vir negociar a Genebra. Não é disso que se trata, quando se fala em negociações. Trata-se de desarmar a popularidade de Bin Laden no mundo muçulmano, de desarmar politicamente o terrorismo islâmico. Como? Dando passos concretos para ir ao encontro das legítimas reivindicações dos palestinianos. Fazer-lhes justiça e exigir depois a contrapartida. Israel é a chave do problema. Desde sempre. Se isso tivesse sido feito há dez, há vinte anos atrás, muitas tragédias teriam sido evitadas e não teríamos chegado a este ponto. Mas mais vale tentar agora do que nunca. Porque a alternativa é continuarmos reféns do terrorismo islâmico porque os Estados Unidos são reféns de Israel."

MST tem razão. O Ocidente tem que obrigar Israel a aceitar uma paz justa e equilibrada, que respeite os direitos dos palestianos. Mas não acredito que isso ponha termo aos desmandos assassinos de Bin Laden e seus sequazes; ainda que a questão palestiniana conhecesse um desfecho pacífico - leia-se, com o retorno às fronteiras de 1967, o reconhecimento pleno de um estado palestiniano independente, a soberania partilhada de Jerusalém, a justa divisão dos recursos hídricos, o fim dos colonatos, etc - o terrorismo fundamentalista não terminaria. E porquê? Porque Bin Laden combate a própria existência do Estado de Israel, e não apenas a ocupação de determinados territórios. Porque a Al Quaeda combate o Ocidente por tudo aquilo que ele significa: liberdade, tolerância e democracia. Princípios que ofuscam as mentes obscurantistas dos fanáticos, cegos pelo ódio irracional que lhes foi incutido pela deturpada fé que abraçaram.

Vejamos um exemplo de como o terrorismo, ao contrário da chamada "guerra de guerrilha", não precisa de apoio popular para sobreviver: de acordo com estatísticas recentes, apenas 3% dos bascos confessam alguma admiração pela ETA. Os restantes 97% da população, incluindo sectores autonomistas e até independentistas da sociedade basca, consideram-na um bando de assassinos. Ou seja, os terroristas da ETA não disfrutam de grande popularidade na sua própria terra natal. Mas isso não os impede de continuar a matar, à revelia do estado de direito e da sociedade democrática em que vivem.

O terror não precisa de aceitação popular, porque a vontade do povo não interessa ao terrorista. Quem recorre à violência para impôr a sua vontade, não demonstra respeito pela da maioria. E assim sendo, não precisa de "popularidade" para sobreviver politicamente, ou para fazer novos prosélitos.

terça-feira, março 23, 2004

INQUALIFICÁVEL Partilho a indignação do Nuno Guerreiro, a respeito de um comentário do Filipe Moura (um dos autores do Blogue de Esquerda), que diz o seguinte:

"É por causa desta duplicidade de critérios, deste complexo do Holocausto que o Ocidente tem em relação a Israel, que houve o 11 de Setembro, o 11 de Março e há-de haver mais. Quando é que o Ocidente se aperceberá de que antes os israelitas do que nós?"

Como é que é isto possível? Deixo-lhe um conselho, senhor Filipe Moura: junte-se à Al Quaeda.

segunda-feira, março 22, 2004

TERROR CONTRA TERROR o assassínio do Sheik Yassin, fundador e líder espiritual do Hamas, não ajuda em nada na luta contra o terrorismo. Não que eu chore o velho caquético que mandava kamikazes matar dezenas de pessoas inocentes. Não que eu ache que se deva negociar com o Hamas. Simplesmente, creio que existiam outras formas de resolver a questão. Por exemplo, detê-lo e julgá-lo por incitamento de actos terroristas (se não de participação nos mesmos). Israel tinha os meios necessários para o capturar. Não era necessário lançar um míssil contra um velho paraplégico.

A FALSA PAZ A Europa vive em paz há mais de 50 anos. Exceptuando os conflitos relacionados com o processo de descolonização - que tiveram o fim que se conhece - os países europeus descansaram à sombra do guarda-chuva americano durante cinco décadas. Gerou-se uma falsa cultura de paz, de não aceitação da guerra. A Segunda Guerra Mundial seria assim a última de todas, o confronto final que poria fim a todos os conflitos armados.

Gerou-se também uma mentalidade segundo a qual são sempre necessárias duas partes para fazer um guerra. Se nós formos bonzinhos, se não nos metermos com ninguém, se ficarmos no nosso cantinho e recorrermos sempre a palavras bonitas, também ninguém nos incomoda. O Maio de 68 veio dar ainda mais força a esta corrente; a complexada geração de soissante-huitards que hoje governa a Europa reflecte bem as crenças (e as ilusões) dessa época.

Muita gente continua a pensar assim. Para estas pessoas, é culpa nossa se os terroristas nos atacam. Nós somos os capitalistas decadentes do Ocidente, os pecadores manchados pela cegueira do lucro e pela alienação da sociedade consumista. Eles são os bons selvagens, que recorrem à arma dos pobres - o Terror - para combater as injustiças de que são alvo. Alguns chegam ao ponto de legitimar o terrorismo, como se existisse o bom terror - aquele que tem causas politicamente correctas - e o mau. Na verdade, o terror é sempre mau, independentemente das causas que lhe estão na génese.

Quando queremos a paz a todo o custo, arriscamo-nos a dar ainda mais força aos inimigos. A resposta ao terror tem de ser firme, inflexível e implacável. Negociar com os terroristas, como aconselhou o senador Mário Soares, é reconhecer-lhes legitimidade política... além de constituir um convite a novas acções terroristas.

Creio que é necessário desmistificar três coisas essenciais: primeiro, a ofensiva da Al Quaeda na Europa não se deve à invasão do Iraque. Segundo, não é por sermos aliados dos EUA que nos tornamos um alvo; e, por último, a Al Quaeda não combate por um mundo mais justo ou mais fraterno. Bin Laden não se arvora em defensor dos oprimidos, até porque ele é um privilegiado por excelência.

A Al Quaeda combate o Ocidente e tudo o que ele significa: democracia, tolerância e liberdade de costumes. A América, enquanto expoente máximo desse mesmo Ocidente, é o alvo principal. Agora imaginemos o que aconteceria se os EUA fizessem o que Bin Laden mais deseja: retirar do Médio Oriente, entregando aqueles povos ao Califado. E imaginem depois o que aconteceria se os EUA, nessa onda isolacionista, retirassem completamente da Europa. Não é isso que os Louçãs, Rosas e afins mais desejam? Imaginem a rica e opulenta Europa, com os seus falsos pacifistas, desarmada e indefesa à mercê da barbárie...

sexta-feira, março 19, 2004

NOVOS LINKS inseri ligações para o Ociosidade, do meu estimado colega António Larguesa, e para o interessante Deadalus.

terça-feira, março 16, 2004

SONDAGEM POLITICAMENTE INCORRECTA... A notícia é do Público e, como bem referiu o Nuno Gouveia, "(...) curiosamente não tem sido muito explorada em Portugal... Se os resultados fossem ao contrário, seria de certeza tema de primeira página". Aqui fica um excerto:

" A maioria dos iraquianos acredita que a sua vida melhorou desde que o antigo ditador Saddam Hussein saiu do poder. Esta conclusão resulta de um inquérito a 2500 iraquianos, realizado a pedido de um conjunto de estações de televisão internacionais que inclui a inglesa BBC, a norte-americana ABC News, a alemã ARD e a japonesa NHK. Os resultados são divulgados no dia em que passa um ano sobre a cimeira dos Açores, onde Blair, Bush e Aznar decidiram invadir o Iraque à revelia do Conselho de Segurança da ONU.

Quase metade dos inquiridos (49 por cento) concordou com a invasão do seu país pela coligação liderada pelos Estados Unidos, contra 39 por cento que se manifestaram contra.

À pergunta sobre se a vida dos iraquianos tinha melhorado depois da queda do regime de Saddam, 57 por cento responderam afirmativamente, contra 19 por cento que disseram que piorou. Para 23 por cento dos inquiridos as condições de vida no país permaneceram iguais às do tempo do antigo ditador.

Sobre o futuro próximo, os iraquianos mostraram-se mais optimistas, com 71 por cento a dizerem que a situação vai melhorar, contra seis por cento que acham que as coisas vão piorar. Nove por cento dizem que tudo vai ficar na mesma."


O resto da notícia pode ser lido aqui.

A FRASE Li a seguinte citação no excelente blog Blasfémia: "We are not fighting so that you will offer us something. We are fighting to eliminate you." Hussein Massawi, antigo líder do Hezbollah.

O PRÓXIMO ALVO De acordo com a edição de hoje do jornal Público, a Mossad aponta Roma e o Vaticano como os próximos alvos da Al Quaeda. Ao que parece, os terroristas querem atingir o coração da Cristandade, não obstante o facto de o Papa ter sido um dos que mais se opôs à invasão do Iraque. A verdade é que a Europa será sempre um alvo para o Terror, por muito que se encolha aterrorizada, e se desligue dos EUA para não desagradar aos fundamentalistas. Os terroristas querem destruir a nossa civilização. Não é por sermos mais ou menos pró-americanos que deixaremos de ser um alvo a abater. Pelo contrário, sê-lo-emos sempre enquanto existirmos, por tudo aquilo que significamos. Tentar apaziguar o Terror será o maior erro que podemos cometer. Bem diz o povo: quanto mais se baixa, mais se lhe vê o rabo.

FINALMENTE O blog sobre a Roma Antiga está operacional. Ainda falta acertar certos aspectos, mas contém já alguns posts. Em conjunto com o Marcos e o Parca, co-autores deste novo projecto, agradeço as vossas visitas e sugestões!

segunda-feira, março 15, 2004




OS IDOS DE MARÇO O Abrupto e a Bomba recordaram o assassinato de César, ocorrido a 15 de Março do ano 44 a.C.. Da minha parte, e como que a assinalar a efeméride, republico um velho post meu (10/12/2003) sobre esta personagem central na história da Roma Antiga e da própria Europa:

"Dois mil anos depois da sua morte, César (Caius Iulius Caesar – 100 a 44 a.C.) continua a dividir opiniões. Muitos consideram-no um homem obcecado pelo poder, capaz de tudo para o atingir. Vêem-no como um inimigo da liberdade, um general que derrubou a república romana e instituiu a tirania. Eu, contudo, admiro César pela sua genialidade, coragem e ousadia.

A República que César derrubou não era propriamente uma democracia. Algumas dezenas de famílias aristocráticas – tanto da nobreza patrícia como da nobreza plebeia - controlavam a vida política e económica de Roma, sendo igualmente os principais beneficiários das grandes conquistas do séc. II e I a.C., pelas quais se tornaram proprietárias de gigantescos domínios fundiários na Itália, África e Hispânia. As províncias eram exploradas de forma brutal pelos governadores nomeados pelo senado; não tendo de prestar contas a ninguém, estes procônsules viam as províncias como possessões pessoais que sugavam até ao tutano. Ao fim de contas, a libertas que Bruto e Cícero tão apregoavam era o direito dos poderosos usarem as leis e as instituições em seu próprio proveito.

A enorme extensão do império tornava necessária a instauração de um poder central forte. O império não podia continuar a ser dirigido por um senado dividido por violentas facções rivais e sacudido por sangrentas guerras civis. Este estado de coisas tornava Roma extremamente vulnerável face aos bárbaros, como se pôde ver pela invasão dos Cimbros e Teutões (104 a.C.), que quase destruiu o império.

É verdade que César cometeu actos cruéis: os massacres dos lusitanos (que acabaram definitivamente com a resistência destes ao domínio romano), e das tribos belgas e gaulesas; a mutilação dos dois mil defensores da fortaleza gaulesa de Uxoledonum, para dar o exemplo aos restantes combatentes gauleses; e a execução de Vercingetórix, depois do seu triunfo. No entanto, e por mais condenáveis que nos pareçam tais actos, a verdade é que César agiu conforme a mentalidade da época, dando ao mesmo tempo provas de grande generosidade, honradez e magnanimidade. Recusou decretar proscrições, amnistiando todos os partidários de Pompeu, à excepção dos que, depois de perdoados, pegaram novamente em armas contra ele. Reabilitou os filhos dos proscritos de Sila. Promulgou leis a favor do povo, com a criação de colónias no ultramar para veteranos das legiões e proletários das cidades. Não perseguiu os adversários políticos, por entender que a oposição era necessária para aperfeiçoar o seu governo. Concedeu a cidadania integral aos italianos, tornando-os iguais em direitos e deveres ao habitantes de Roma. Obrigou os governadores provinciais a prestar contas pelos seus mandatos. Pôs em marcha um vasto programa de obras públicas, tanto em Roma como nas províncias.

Do ponto de vista militar, César foi um comandante brilhante. A rapidez com que se deslocava, a consideração que demonstrava pela vida dos seus soldados (chorou os quinhentos homens que perdeu em Gergóvia), e a ousadia das suas campanhas fazem dele um dos melhores generais de sempre. As vitórias de Alésia, Farsália, Alexandria e Munda revelam que a vitória não depende do número ou da logística, mas da capacidade dos comandantes e da qualidade e motivação das tropas.

Paradoxalmente, ao assassinarem César, os conspiradores dos Idos de Março acabaram por dar ainda mais força ao cesarismo. A guerra civil que se seguiu permitiu a instituição do Principado e pôs fim a cinco séculos de república aristocrática. Augusto e os seus sucessores levaram o cesarismo ao extremo, suprimindo as liberdades públicas e instaurando um regime monárquico sob uma fachada republicana."

A VITÓRIA DO MEDO Antes de mais, é me pessoalmente indiferente se a Espanha é governada pela a esquerda socialista ou a direita conservadora. A minha única preocupação neste domínio reside em saber qual das duas será melhor para Portugal… e, sinceramente, creio que é indiferente. E isto quer se trate da política europeia quer do que diz respeito às relações transatlânticas. Se o PSOE se voltasse para o eixo franco-alemão, Portugal ganharia peso político-diplomático em Washington. Mas não acredito que o governo Zapatero siga esse caminho, independentemente da retórica entretanto empregue para aplacar certos sectores anti-americanos da sociedade espanhola.

Os espanhóis decidiram de forma democrática, e há que respeitar a vontade do povo. Mas independentemente do respeito que as eleições democráticas merecem a qualquer um de nós, creio que seria oportuno reflectir no que significa para a Al Quaeda esta surpreendente vitória do PSOE.

Todos sabemos que o PSOE venceu apenas graças ao atentado. A Al Quaeda conseguiu assim o que mais desejava: forçar a Espanha a abandonar a coligação, através do medo e do terror. As pessoas podem dizer que votaram no PSOE para protestar contra o PP, mas na realidade votaram nos socialistas porque não querem continuar a ser um alvo dos terroristas. Ou seja, foi o voto do medo e do terror. Bin Laden conseguiu, e algures numa qualquer caverna do Paquistão, o patriarca da Al Quaeda deveria estar agora a abrir garrafas de champagne… se o Islão wahabita lhe permitisse beber bebidas alcoólicas, claro.

Além disso, que fará o PSOE no poder? Poderá esquivar-se às suas responsabilidades na guerra contra o terror? Alinhará com a França, transformando-se numa avestruz com o bico molhado em petróleo?

NOVOS LINKS inseri ligações para o excelente Midrash e para a interessante Blasfémia, nascida da fusão blogosférica entre o Mata Mouros, o Cataláxia e o Cidadão Livre.

sexta-feira, março 12, 2004




ECCE HOMO (III) Assisti ontem à "Paixão de Cristo", pelo que posso finalmente comentar este polémico filme de Mel Gibson.

Trata-se, de facto, de um filme de grande violência. Há jorros de sangue q.b, costelas expostas, olhos desfeitos, etc. É violência a mais. Mas não creio que, como algumas pessoas escreveram, se tenha produzido uma "privatização da violência", como se o sofrimento de Jesus fosse superior ao de todos os restantes supliciados pelo poder imperial romano. Creio que, pelo contrário, o realizador quis mostrar que os tormentos infligidos ao Filho do Homem simbolizam o sofrimento de todos aqueles que, por esse mundo fora e ao longo de toda a história da Humanidade, defenderam a verdade e a justiça contra os abusos dos detentores do poder. E isto não obstante "A Paixão..." ser apenas um filme religioso e não um manifesto político. Esta é, obviamente, uma opinião minha, de que outros certamente discordarão.

Creio que a extrema violência prejudica o filme, tornando-o demasiado brutal. No entanto, a fotografia e os efeitos especiais são de grande qualidade.

Mas não foi a violência que realmente me incomodou em "A Paixão de Cristo", mas sim a imagem que o filme dá dos Judeus. Mel Gibson quis reproduzir fielmente os evangelhos (ou melhor, um deles, o de S. Mateus, precisamente o mais anti-semita); há que ter em conta que os textos bíblicos não pretendem ser relatos históricos, e que um filme baseado nos mesmos não se pode assimir como tal. Foi o que Gibson fez, infelizmente, quando disse que este filme é "uma reprodução fiel das últimas horas de Jesus Cristo". Numa altura em que os ódios políticos, ideológicos e religiosos renascem um pouco por todo o mundo, é pena que este filme contribua ainda mais para o renascer do anti-semitismo e para a demonização dos judeus enquanto povo maldito.

O Pilatos de "A Paixão de Cristo" é um governador débil, com medo de Caifás e dos arruaceiros de Jerusálem. Manipulado pela mulher - encarnação típica da matrona romana benfeitora do cristianismo - demonstra pena e humanidade para com o Nazareno. Gibson coloca de um lado os gentios simpáticos, sensíveis e humanos (coisas que, na realidade, Pilatos não era), e do outro os judeus mauzões, sedentos do sangue de Jesus. O filme fica a perder com esta visão maniqueísta das coisas e tão afastada da verdade histórica (sobre este assunto, ver os anteriores posts, "Ecce Homo I" e "Ecce Homo II").

quinta-feira, março 11, 2004

ESTUPORES A notícia é do Público Online, e vem confirmar os piores receios. O atentado de Madrid foi reivindicado por um grupo ligado à Al Quaeda. Se tal se confirmar, a partir de agora todos os europeus são potenciais alvos desse bando de canalhas. A notícia diz o seguinte:

"Um comunicado atribuído à Al-Qaeda foi enviado ao jornal "Al Quds al-Arabi", sedeado em Londres, reivindicando os atentados desta manhã em Madrid em nome da organização terrorista de Bin Laden.

Segundo o jornal em língua árabe, citado pela Reuters, os atentados são descritos pelos autores da missiva como um "ataque contra os cruzados". "Infiltrámo-nos com sucesso no coração dos cruzados europeus e atacamos uma das bases da aliança cruzada", lê-se na carta, que apelida os ataques de "Operação Comboios da Morte".

A carta é assinada pelas Brigadas Abu Hafs al-Masri, o mesmo grupo que enviou missivas semelhantes ao jornal, reivindicando em nome da Al-Qaeda os atentados contra duas sinagogas de Istambul, em Novembro passado, e o atentado contra a sede da ONU, em Bagdad, quatro meses antes."

ANTI-SEMITISMO Numa extensa reflexão sobre o renascer no anti-semitismo (cuja leitura recomendo vivamente), o Nuno Guerreiro reproduz uma interessante anedota húngara a este respeito, que não resisti transcrever:

«Durante a Guerra dos Seis Dias, em 1967, um húngaro encontra um amigo na rua. Vendo-o muito sorridente, pergunta-lhe porque está tão feliz. “Ouvi dizer que os israelitas abateram hoje seis caças MIG de fabrico soviético”, responde o outro. No dia seguinte os dois voltam a encontrar-se, desta vez o amigo está ainda mais radiante: “Os israelitas abateram mais oito MIGs”, conta ele. No terceiro dia o amigo está agora cabisbaixo. “Então? Os israelitas não abateram mais nenhum MIG?”, pergunta o outro tentando perceber a razão da tristeza. “Abateram sim, mas hoje explicaram-me que os israelitas são judeus.”»

HOJE TODOS SOMOS ESPANHÓIS O massacre de centenas de pessoas inocentes em Madrid mostra o quão importante é continuar a luta contra o terrorismo. Não há palavras que possam definir este odioso crime; um grupo de fanáticos tenta convencer o mundo da justiça da sua causa, espalhando o horror e a morte. Um punhado de bárbaros tenta vergar uma democracia aos seus ditames e à sua vontade, ameaçando com o massacre indiscriminado de civis inocentes.

Hoje todos somos espanhóis, em solidariedade com as vítimas do horror e respectivas famílias. E também solidários para com este estado democrático amigo, que o destino colocou na primeira linha do combate ao terrorismo. E espero que os tristes acontecimentos na capital espanhola sirvam para que alguns europeus abram finalmente os olhos em relação ao terrorismo, que é bárbaro, cruel e injustificado tanto em Madrid, como em Nova Iorque ou em Tel-Aviv. Independentemente das causas que lhe estejam na génese (e até da relativa justeza de algumas delas), não se pode negociar com o terror.

terça-feira, março 09, 2004




DEUS E O AMOR Meio a sério meio a brincar, o Alex escreveu o seguinte, no fim de um post dedicado à beleza feminina:

"Dedico [o post] também ao Filipe, que apesar de gostar de Teologia, creio não ter estudado tão bem este tema tal como ele merecia... e este é o estudo Teológico que mais rapidamente e seguramente recompensa o estudioso (isso garanto eu)... ainda por cima tem umas colegas muito giras e inteligentes... quem sabe depois de bem estudado este assunto da mais alta Teologia não mudavas de opinião sobre o aborto e outras coisas..."

Enganas-te, Alex; a beleza das mulheres é mais uma razão para eu crer em Deus. E acredita que me tenho dedicado a um intensivo estudo (de campo!) nesta matéria, estudo esse que me permitiu chegar a uma conclusão: Deus criou o homem para a mulher e a mulher para o homem; logo, Deus abençoa o amor entre ambos, e a sexualidade é uma dádiva do Criador à Humanidade. Mas o que é o amor? O prazer físico? O vulgar engate? Não creio. E o que é a beleza? Existe apenas nos rostos perfeitos e nos corpos esculturais? Não creio.

Retribuindo a tua amabilidade, recomendo-te a leitura do belíssimo livro bíblico do Cântico dos Cânticos. Aqui fica um excerto:

"Sou o narciso de Saron, o lírio dos vales. Como o lírio entre os espinhos, assim é minha amiga entre as jovens. Como a macieira entre as árvores da floresta, assim é o meu amado entre os jovens; gosto de sentar-me à sua sombra, e seu fruto é doce à minha boca. Ele introduziu-me num celeiro, e o estandarte, que levanta sobre mim, é o amor.

Restaurou-me com tortas de uvas, fortaleceu-me com maçãs, porque estou enferma de amor. Sua mão esquerda está sob minha cabeça, e sua direita abraça-me. Conjuro-vos, ó filhas de Jerusalém, pelas gazelas e corças dos campos, que não desperteis nem perturbeis o amor, antes que ele o queira. Oh, esta é a voz do meu amado!"
(Cântico dos Cânticos, 2,1-8)

segunda-feira, março 08, 2004

O MONSTRO O que pensar de um ser como Marc Dutroux? Um homem que torturou, violou e assassinou crianças? Devemos fechá-lo numa cela escura e deitar fora a chave? Devemos condená-lo à morte?

Não consigo imaginar o que faria se um qualquer Dutroux torturasse, violasse e assassinasse uma pessoa da minha família. Provavelmente, desejaria a vingança. Um acto tão odioso libertaria o animal que há dentro de cada um de nós; despertaria a fera indomada que vive oculta debaixo do verniz e da educação que a civilização nos impôs. Sinceramente, não sei o que faria; mas não seria coisa boa, com certeza.

Por isso existe o Estado. Os cidadãos abdicam das suas prerrogativas animais, consagradas pelo Direito Natural, em prol da super-estrutura em que a nossa sociedade se organizou. Cabe ao Estado defender-nos e aplicar a Justiça. É o que recebemos em troca de abdicarmos de determinados direitos. Entre eles, o direito à vingança, à justiça de talião.

Deus nos livre de homens como Dutroux. É que além de mancharem a face da Terra com os seus crimes hediondos, os Dutroux's deste mundo conseguem despertar em nós os maus sentimentos que, para bem de todos, deviam permanecer adormecidos.

Enquanto cristão, só posso desejar que Marc Dutroux se arrependa dos seus crimes e que a prisão o regenere. Que a Justiça seja feita punindo os criminosos, mas que o castigo seja acompanhado pela regeneração das pessoas. E que a Justiça procure consolar os familiares das vítimas. Sem isso, ela ficará por fazer.

A CONDIÇÃO HUMANA A Rute comentou o caso dos panfletos com imagens chocantes, escrevendo o seguinte: "Se os defensores do aborto assim o pretendessem, também poderiam chocar o "inimigo" com imagens de crianças maltratadas pelos pais, muitas vezes negativamente surpreendentes... Poderiam expor a fome, as queimaduras, contusões, cortes profundos e rostos sofridos de milhares de crianças deste mundo, alegando que estas são as consequências do nascimento de um filho indesejado ou num meio de impossibildades... Mas creio que a razão, a simples razão, não necessita de pseudo-argumentos como estes."

Antes de mais, devo dizer que discordo e que me desassocio por completo dessa triste iniciativa da associação "SOS Vida", tal como a generalidade daqueles que se opõem ao aborto (pelo menos, os que conservam um pouco de lucidez e sensatez). No entanto, e independentemente de tais considerações, gostava de comentar este texto da minha amiga Rute.

A morte não é solução para nada. Em vez de pedirem a morte de seres inocentes de modo a poupá-los aos sofrimentos da vida, os pró-aborto deviam lutar para que situações como as acima descritas não continuem a verificar-se em pleno século XXI. As "as queimaduras, contusões, cortes profundos e rostos sofridos de milhares de crianças deste mundo" não são consequência do "nascimento de um filho indesejado ou num meio de impossibildades", mas sim resultado da maldade humana, fenómeno que sempre existiu e existirá. Nunca antes a raça humana experimentou semelhantes níveis de riqueza e bem estar; pela primeira vez na história da Humanidade, temos todos os meios possíveis e imaginários para que todas as crianças usufruam de condições de vida minimamente aceitáveis. Os movimentos pró-aborto deviam por isso gastar o seu tempo e as suas energias a lutar para que as crianças "indesejadas" (sic) tenham os mesmos direitos e oportunidades que as restantes.

Além disso, quem somos nós para nos arrogarmos ao direito de decidir quem pode ser feliz ou não? E o que é a felicidade? Alguém saberá?

sexta-feira, março 05, 2004




IMAGENS CHOCANTES É de lamentar a distribuição nas escolas de panfletos com imagens chocantes de alegados abortos. A notícia caíu como uma bomba, dando argumentos aos movimentos pro-choice e, claro, aos lobbies anti-católicos. Lêem-se já as habituais imprecações contra a padralhada (basta ler os comentários ao post do Barnabé sobre este assunto), pondo tudo no mesmo saco. A insensibilidade, a estupidez e o fanatismo do padre que ordenou a distribuição dos referidos folhetos é tida como extensível a todos aqueles que se opõem à liberalização do aborto. Um disparate; como sempre, a estupidez reage à estupidez.

Não vi os referidos panfletos, mas a descrição feita pelos media parece suficientemente elucidativa. A imagem do feto vendido para churrasco será, sem dúvida, a que mais inquietações levanta. Como é que alguém pode fazer uso de um argumento tão notoriamente falso e disparatado? E como é que alguém ousou mostrar semelhante barbaridade a crianças de seis anos?

Todavia, seria bom que alguns adultos se familiarizassem com a barbaridade que é o aborto. Bem sei que a opinião pública dominante não gosta de ver coisas desagradáveis. A fome, a miséria, a doença e a morte são coisas que não gostamos de ver. Sabemos que existem, mas não as queremos vislumbrar e muito menos ter por perto. Passa-se o mesmo com o aborto: demora apenas cinco minutinhos e não dói nada, quer acreditar a nossa boa consciência. Todavia, talvez não seja um processo assim tão limpo.

quinta-feira, março 04, 2004

FICÇÃO HISTÓRICA Concordo com o Ricardo Manuel, dos Meninos de Ouro, para quem “(...) infelizmente, as intelectualidades lusas ainda não compreenderam que enquanto os filmes portugueses não forem populares e lucrativos, a sétima arte nacional permanecerá com os seus vícios parasitários dos dinheiros públicos. "Os Imortais" são um dos poucos bons exemplos a seguir - os lucros chegarão um dia. E eu adoraria poder todos os domingos assistir a um bom filme português, em língua portuguesa. Perdi a fé na Velha Guarda, mas espero que as novas gerações sigam um caminho melhor e mais glorioso. O cinema pode e deve ser uma das mais importantes expressões da cultura portuguesa.”

Gostava que em Portugal se apostasse mais na ficção histórica. Aliás, tem sido essa a tendência no resto da Europa, quer se trate de filmes, telefilmes ou séries televisivas. Cada vez mais, o público europeu manifesta interesse pelas questões históricas, quer sejam abordadas em documentários ou em obras de ficção. Desde que não se caia no erro de hollywoodizar a História, adulterando os factos de modo a agradar ao público, os filmes e séries televisivas de época podem desempenhar um importante papel didáctico junto de miúdos e graúdos.

E, de resto, os nossos cineastas não teriam grande dificuldade em construir enredos interessantes para o público. Personagens como D. Afonso Henriques, D. João I, o Condestável Nuno Álvares, Afonso de Alburquerque, D. João V, o Marquês de Pombal, a par de outros vultos da nossa História, seriam excelentes protagonistas de filmes ou séries de época. A luta pela independência, os amores de Pedro e Inês, os acontecimentos de 1383/1385, a longa epopeia dos Descobrimentos, Alcácer Quibir e a crise dinástica de 1580, as guerras da Restauração, etc, podiam e deviam ser transportados para a tela. O cinema português ficava a ganhar, assim como todos nós.