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quinta-feira, outubro 28, 2004

PARABÉNS ao Nuno Guerreiro, pelo excelente blog Rua da Judiaria. Um espaço culto, tolerante e de aprazível leitura. Parabéns!

terça-feira, outubro 26, 2004

DOGMAS (III) O caso Buttiglione continua a dar que falar. Os eurodeputados de esquerda recusam-se a aceitar a sua nomeação, enquanto Barroso se recusa a mudar de ideias. Aliás, se o fizesse começaria o seu mandato com um inegável sinal de fraqueza.

Julgo que temos de ter em conta o cerne do problema: conseguirá Buttiglione desempenhar correctamente as suas funções de Comissário Europeu? Pessoalmente, creio que sim, uma vez que ele já garantiu que lutará contra qualquer forma de discriminação. Mas conseguirá Buttiglione desempenhar as suas funções de acordo com os desejos da esquerda do Parlamento Europeu? Creio que não. Seria como pedir ao Bloco de Esquerda para apoiar a permanência de Paulo Portas no nosso governo.

Penso que se a Comissão Barroso for aceite pelo Parlamento Europeu (PE), ainda que por escassos votos, a principal consequência poderá ser uma eventual “politização” da Comissão. Fenómeno esse que, em meu entender, seria bastante positivo para o processo de construção europeia; como federalista, penso que as comissões devem cada vez mais assemelhar-se a um governo europeu.

Por outro lado, creio que este episódio chamou novamente a atenção para a ditadura do “politicamente correcto”, que ameaça cada vez mais a nossa liberdade de opinião e de expressão. Nesta Europa democrática em que vivemos, todos têm direito a pensar e a dizer o que bem entenderem: opiniões tão díspares como as de Rocco Buttiglione, Francisco Louçã, Álvaro Cunhal e Jean Marie Le Pen, podem e devem manifestar-se livremente, e sem que aquele que as emita seja de alguma forma perseguido ou censurado.

P.S.: agradeço e retribuo inteiramente ao Timshel as simpáticas palavras que me dirigiu, e recomendo a leitura do post que escreveu sobre este mesmo assunto.

quarta-feira, outubro 20, 2004

ATÉ QUANDO? Alberto João Jardim continua a atacar a imprensa, a ameaçar os jornalistas com "limpezas" e "saneamentos", a lamentar-se por ser "demasiado bem educado para com a oposição", e a dizer outras barbaridades. Será verdade o que diz o ditado, que "cada povo tem o governo que merece"?

terça-feira, outubro 19, 2004



O ÚLTIMO DITADOR DA EUROPA Alexander Lukaschenko, presidente da Bielorrússia, venceu um referendo que lhe permitirá permanecer indefinidamente na presidência. Um infeliz revés para a causa da democracia...

sexta-feira, outubro 15, 2004

DOGMAS (II) Com o tom habitual, o Barnabé escreve sobre a nomeação do comissário italiano:

"(...) José Manuel Fernandes [no Público de hoje] tenta fazer passar a ideia de que Rocco Buttiglione tem "impecáveis credenciais liberais" e que as suas opiniões àcerca da homossexualidade ou do casamento são meras opiniões, sem influência na execução política do senhor. Em primeiro lugar, vai ser complicado como é que alguém tem "impecáveis credenciais liberais" se faz parte de um governo Berlusconi. JMF pode passar pela redacção da Economist, que foi processada por Berlusconi por ter afirmado que este era pouco menos do que um mafioso inaceitável para o governo de qualquer estado de direito, e aproveitar para esclarecer os camaradas da tresmalhada publicação britânica. Em segundo lugar, JMF acha que as opiniões de Buttiglione não interferirão no seu trabalho como comissário. É, uma vez mais, uma opinião; mas foi exactamente disso que Buttiglione não conseguiu convencer uma maioria de eurodeputados no seu exame, após horas de conversa."

Isto é pura demagogia. Primeiro, porque o facto de pertencer ao governo Berlusconi não significa que o dito senhor não tenha convicções liberais, nomeadamente a respeito dos direitos individuais e das minorias. Além disso, o autor do texto devia saber que Buttiglione pertence ao partido da Democracia Cristã, e não à polémica "Forza Italia", de Berlusconi. Em segundo lugar, Buttiglione não conseguiu convencer apenas os eurodeputados da esquerda (que não são a maioria), que como sabemos não tem grande respeito por opiniões divergentes em relação ao seu "politicamente correcto", especialmente se quem as emite estiver ligado à Igreja.

No site da BBC lê-se o seguinte:

"Mr Buttiglione told his parliamentary hearing that homosexuality was a "sin", claiming that this would have no effect on his political activities so long as he did not think homosexuality was a crime. He conceded, however, that he would oppose any Commission proposal which ran foul of his moral principles."

Houve quem visse na última frase ("He conceded, however, that he would oppose any Commission proposal which ran foul of his moral principles"), uma prova de que o italiano obstaria a quaisquer medidas da Comissão a favor das minorias sexuais, de modo a não "incentivar o pecado". Sinceramente, não vejo o que é que esta frase tem de especial. Qualquer um a poderia proferir... o problema para a esquerda fundamentalista é que Buttiglione é católico e, logo, deve forçosamente esquecer as suas próprias convicções pessoais.

Além disso, o que é "incentivar o pecado"? Legalizar as uniões gay? Permitir a adopção de crianças por homossexuais? Ora, para além de serem questões a decidir pelos próprios Estados (e não pela Comissão), são assuntos que vão para além da religião ou dos valores morais. A adopção de crianças por gays, por exemplo, é contestada publicamente por ateus e agnósticos.

Para terminar, e convém não esquecer, o Comissário afirmou que não interferiria nos direitos das minorias sexuais. Deixem o homem ter a sua fé e agir de acordo com a sua consciência! Ou será isso um privilégio de apenas alguns?



DOGMAS A recente recusa da esquerda parlamentar europeia em aceitar o italiano Rocco Buttiglione como Comissário da Justiça e Direitos Humanos, mostra o quão intolerantes, sectários e fundamentalistas conseguem ser os profetas dos dogmas do "politicamente correcto".

Buttiglione é um eminente filósofo, um político de reconhecida competência e um intelectual com grande “bagagem” cultural. Não existe nenhuma razão objectiva que o torne indigno da pasta de Comissário. Aqueles que o acusam dos "pecados capitais" de intolerância ou obscurantismo esquecem que o próprio reconheceu publicamente que existe uma clara distinção entre direito e moral, e que muitas coisas que ele considera "imorais" não têm necessariamente de ser proibidas. Por exemplo, o facto de ele, enquanto católico, considerar a homossexualidade um pecado, não significa que entenda que o Estado se deva intrometer em tais assuntos. Ao afirmar isto, Buttiglione deu uma lição de laicismo e tolerância aos arautos do "politicamente correcto", que com tanto zelo se têm tornado os Inquisidores dos nossos dias.

terça-feira, outubro 12, 2004

A CENSURA EXISTE? Algumas pessoas deram-se agora conta do facto de ainda existir censura em Portugal. Parece-me que isso não é novidade. Basta lermos com atenção um qualquer jornal local, regional ou universitário, para constatar que poucos escapam à subserviência e à dependência em relação aos poderes políticos, económicos e universitários. E é triste que tantas pessoas se considerem "jornalistas" nessas condições.



CANTO HOMÉRICO O Parca, do excelente blog "Tempore", encontrou um site que contém reconstituições do canto homérico, da autoria de dois professores da Universidade de Viena. Não há certezas quanto à sua autenticidade, evidentemente; todavia, e como refere o Parca, "soam bem".

BUROCRACIAS Por vezes, torna-se muito complicado pedir uma simples informação:

Aluno: "Boa tarde, é dos Serviços Académicos? Pode dar-me uma pequena informação?"

Funcionária: "É sim, mas não o posso ajudar porque ainda são 13h58. Os Serviços só abrem às 14h00. Por favor ligue daqui a bocadinho".

(Passam-se cinco minutos)

Aluno: "Boa tarde, fala dos Serviços Académicos? Liguei há pouco por causa de uma informação... será que me pode ajudar agora?"

A mesma funcionária: "Desculpe, está aqui muita gente e não o posso atender. Ligue para o 253******, que talvez o possam ajudar."

Aluno: "Pois, foi por isso que liguei dois minutos antes de os serviços abrirem, mas a senhora disse-me para ligar agora... está lá??"

(Claro está que no número indicado ninguém atende...)

sábado, outubro 02, 2004

STEPHEN HAWKING E OS LIMITES DO RISÍVEL O Gato Fedorento recebeu emails de alguns leitores indignados com uma post humorístico sobre a vida sexual de Stephen Hawking. Defendendo-se dos críticos, o autor do dito post escreveu o seguinte:

“Sejamos francos: à partida, todos nós temos tendência para ficar chocados quando alguém faz humor sobre deficiências profundas. Mas o que está por detrás dessa atitude protectora? É simples: a ideia de que os deficientes são uns coitadinhos. Poupá-los à pilhéria, eis a expressão suprema da piedadezinha. Ora, apesar de não podermos negar que eles de facto carregam um fardo muito pesado, uma das maiores dificuldades que os deficientes enfrentam é precisamente conseguir libertar-se desse modo que a sociedade tem de olhar para eles. Essa protecção que lhes reservamos é, ao mesmo tempo, uma perversa forma de os inferiorizar.

Quem, como eu, cresceu a ver dramalhões televisivos dos anos 80, sabe que há duas coisas que os deficientes abominam: que alguém os tente ajudar, quando eles não precisam (atenção, isto não é uma indirecta para os autores dos mails indignados); e que se tenha pena deles. Ninguém consegue suportar uma existência baseada na comiseração alheia. A pena não edifica. Pelo contrário, abafa, estiola, gera acomodação e desistência.”


Concordo com o autor. De facto, a “piedadezinha” é também uma forma de discriminação. Deixar de fazer humor acerca de uma pessoa por ela ser deficiente, ou por ter uma raça ou orientação sexual diferente, é uma forma de a considerar “coitadinha”, coisa que ninguém gosta de ser. O próprio Stephen Hawking desmonstrou isso mesmo, ao participar num episódio da série animada “Os Simpsons”, em que se parodia a sua voz “informatizada”.

Creio que existem, contudo, limites para o humor, embora não os da “piedadezinha”; são eles os do bom gosto, da sensibilidade pelo sofrimento alheio e pelos sentimentos das pessoas. Uma coisa será fazer crítica social e política, ou brincar inocentemente com uma determinada situação – a voz de Stephen Hawking, por exemplo -, outra será fazer troça dos defeitos físicos ou do sofrimento alheio. Por exemplo, as piadas do “Gato Fedorento” sobre Stephen Hawking são humor de qualidade, ao contrário das piadas brejeiras do Herman Sic", ou das "bocas" de mau gosto que o júri do concurso “Um Sonho de Mulher” lançava a certas concorrentes. Creio que é necessário estabelecer essa clara distinção entre o humor de qualidade – que permite desdramatizar certas situações, de modo a que as possamos encarar de uma forma mais saudável -, e o humor trocista e brejeiro que fere os sentimentos das pessoas.

O mesmo se poderia dizer da forma como o cinema e a televisão encaram as minorias raciais ou sexuais. Reparem que em quase todos os filmes ou séries televisivas norte-americanas, cujos principais protagonistas sejam brancos, existe obrigatoriamente a figura do “negro de serviço”. Na maioria dos casos, este negro é um tipo “porreiro” e divertido, que auxilia o protagonista ou que lhe dá excelentes conselhos. Além disso, costuma possuir mais bondade e generosidade que o humanamente possível, o que é uma forma de nos dizerem: “Estão a ver, é negro mas é porreiro. Não faz mal a ninguém e podia perfeitamente ser branco, ser mesmo um de nós”. A imagem politicamente correcta que o cinema nos transmite a respeito das minorias raciais ou sexuais é, no fundo, racista e paternalista.