sexta-feira, dezembro 31, 2004
TOM BÉLICO Os políticos do PSD e do PP têm usado uma linguagem algo "bélica". Falam sempre de "trincheira", "combate", "exército", "soldados", "atiradores furtivos"... calculo que este fenómeno se deva a uma qualquer vontade (in)consciente, por parte dos líderes dos ditos partidos, em fazer daquelas formações políticas autênticos "exércitos". E, como sabemos, num exército não existe liberdade de opinião e é exigida uma lealdade canina aos líderes, por mais incompetentes que estes sejam.
quarta-feira, dezembro 22, 2004
BOAS INTENÇÕES Independentemente da veracidade das acusações - até que se prove em Tribunal o contrário, as pessoas visadas são inocentes -, as recentes denúncias de abusos sexuais e de irregularidades contabilísticas na Obra do Ardina mostram-nos como este tipo de instituições são vulneráveis a três grandes "perigos":
Em primeiro lugar, à calúnia e à difamação das pessoas dos seus dirigentes, por se tratar de organizações muito "fechadas", onde se torna relativamente fácil lançar suspeitas sobre algo ou alguém, por mais infundadas e injustas que sejam.
Em segundo lugar, e por se tratarem de estruturas quase "familiares", muitas vezes não existe uma nítida distinção entre o que pertence à instituição e aquilo que pertence aos seus dirigentes. Por exemplo, pode suceder que o presidente pague hoje do seu bolso uma determinada despesa da instituição, e que amanhã seja esta a pagar algo ao presidente. Obviamente, estas "familiaridades" e "relaxamentos" acabam por prejudicar as instituições. Por mais voluntarismo e boas intenções que existam, o ideal será respeitar sempre as leis e os procedimentos contabilísticos adequados.
Por último, é certo e sabido que "a ocasião faz o ladrão". Os abusos sexuais e os maus tratos ocorrem nesse tipo de instituições porque as vítimas são pessoas indefesas e desamparadas, a quem a sociedade não protege devidamente. Porque é que o lobo ataca as ovelhas? Porque o rebanho se encontra indefeso.
Por tudo isto, concordo com a Gabriela: estes lares e internatos devem ser encarados como a última opção e um "mal menor", e nunca como "a" solução adequada para os problemas das crianças.
___________________
P.S.: sempre desconfiei da extrema generosidade, entrega e dedicação demonstradas por algumas pessoas. Fico com a impressão que alguns desses beneméritos, ao praticarem nobres e louváveis acções, fazem-no mais por interesse próprio que por amor aos desamparados que auxiliam. Não sou psicólogo, mas parece-me que fazer o bem aos outros - ou aparentar isso - poderá ser uma forma de alimentar o próprio ego e de se procurar "redimir" de alguma culpa inconsciente. Por vezes, fico com a ideia de que os responsáveis por algumas Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) ou Organizações Não Governamentais (ONG) precisam mais de ajuda que as pessoas que dizem auxiliar.
Nada tenho contra quem procura um sentido para a sua própria vida, entregando-se a causas nobres (muito antes pelo contrário!). Mas desconfio daquelas pessoas que precisam desesperadamente de ter a sua própria "causa", misturando o seu orgulho e necessidade de afirmação com uma determinada causa. Estas pessoas não procuram ser utéis da melhor forma possível, como conviria a quem apenas deseja praticar o Bem; simplesmente procuram afirmar-se. E quando assim é, trata-se de uma falsa caridade e de um simples acto de egoísmo. O verdadeiro benemérito age de forma o mais anónima possível, não se envaidecendo do bem que faz e não tendo em vista uma eventual recompensa.
Em primeiro lugar, à calúnia e à difamação das pessoas dos seus dirigentes, por se tratar de organizações muito "fechadas", onde se torna relativamente fácil lançar suspeitas sobre algo ou alguém, por mais infundadas e injustas que sejam.
Em segundo lugar, e por se tratarem de estruturas quase "familiares", muitas vezes não existe uma nítida distinção entre o que pertence à instituição e aquilo que pertence aos seus dirigentes. Por exemplo, pode suceder que o presidente pague hoje do seu bolso uma determinada despesa da instituição, e que amanhã seja esta a pagar algo ao presidente. Obviamente, estas "familiaridades" e "relaxamentos" acabam por prejudicar as instituições. Por mais voluntarismo e boas intenções que existam, o ideal será respeitar sempre as leis e os procedimentos contabilísticos adequados.
Por último, é certo e sabido que "a ocasião faz o ladrão". Os abusos sexuais e os maus tratos ocorrem nesse tipo de instituições porque as vítimas são pessoas indefesas e desamparadas, a quem a sociedade não protege devidamente. Porque é que o lobo ataca as ovelhas? Porque o rebanho se encontra indefeso.
Por tudo isto, concordo com a Gabriela: estes lares e internatos devem ser encarados como a última opção e um "mal menor", e nunca como "a" solução adequada para os problemas das crianças.
___________________
P.S.: sempre desconfiei da extrema generosidade, entrega e dedicação demonstradas por algumas pessoas. Fico com a impressão que alguns desses beneméritos, ao praticarem nobres e louváveis acções, fazem-no mais por interesse próprio que por amor aos desamparados que auxiliam. Não sou psicólogo, mas parece-me que fazer o bem aos outros - ou aparentar isso - poderá ser uma forma de alimentar o próprio ego e de se procurar "redimir" de alguma culpa inconsciente. Por vezes, fico com a ideia de que os responsáveis por algumas Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) ou Organizações Não Governamentais (ONG) precisam mais de ajuda que as pessoas que dizem auxiliar.
Nada tenho contra quem procura um sentido para a sua própria vida, entregando-se a causas nobres (muito antes pelo contrário!). Mas desconfio daquelas pessoas que precisam desesperadamente de ter a sua própria "causa", misturando o seu orgulho e necessidade de afirmação com uma determinada causa. Estas pessoas não procuram ser utéis da melhor forma possível, como conviria a quem apenas deseja praticar o Bem; simplesmente procuram afirmar-se. E quando assim é, trata-se de uma falsa caridade e de um simples acto de egoísmo. O verdadeiro benemérito age de forma o mais anónima possível, não se envaidecendo do bem que faz e não tendo em vista uma eventual recompensa.
domingo, dezembro 19, 2004
LEI DA ADOPÇÃO Ouço na televisão alguém responsável pela alteração da lei da adopção. Este assunto interessa-me, já que coloco como hipótese num futuro não muito longínquo a adopção de uma criança. Fala-se de um problema que já alguém me tinha falado, e que me custa a acreditar mas que pelos vistos é real: há instituições que colocam barreiras à adopção das crianças que acolhem por defenderem que o acolhimento institucional é melhor do que a integração das crianças numa família, ou se calhar mais correctamente, porque sobrevivem dos apoios financeiros que recebem “à peça”, e portanto, quanto mais crianças tiverem à sua guarda melhor.
É este tipo de atitudes que me faz ser imensamente cínica quanto à “boa vontade” entre os homens de que tanto se fala nesta época...
É este tipo de atitudes que me faz ser imensamente cínica quanto à “boa vontade” entre os homens de que tanto se fala nesta época...
domingo, dezembro 12, 2004
POST MAIS OU MENOS SOBRE POLÍTICA Este blog fala muito de política. Eu não vou muito por aí. Sobre política deixo falar quem de direito. No entanto devo aos blogs um aumento grande do meu interesse sobre política, ainda assim limitado, aliado a um maior entendimento de algumas questões básicas, ainda que também limitado.
Sempre olhei para a política como um mundo obscuro e intrincado, onde a teoria das diferentes linhas ideológicas chocava com a prática da sua aplicação e com a complexidade do mundo humano, onde se inclui inevitavelmente o desejo de poder, corruptor das melhores intenções.
Creio compreender que o que separa as diferentes ideologias políticas é o conflito entre o(s) direito(s) individuais e as obrigações do indivíduo perante a sociedade em que está inserido, em que, e de uma forma necessariamente simplista, a ideologia dita de direita privilegia o valor do indivíduo, exigindo-lhe responsabilidade, enquanto a ideologia dita de esquerda privilegia o bem comum, impondo-o em desfavor das necessidades individuais. Se estou certa ou errada outros mais sabedores do que eu o poderão dizer, mas esta forma de ver as coisas simplifica-me (ou não…) a forma como entendo as questões políticas.
Como em relação a tantas outras coisas não acredito em certos ou errados absolutos. Assim sendo, e aliada à minha reiterada ignorância sobre estas questões, dou por mim frequentemente a votar em branco ou a votar inutilmente, isto é, num pequeno partido inócuo.
Depois de fazer a bússola política dou por mim colocada no quadrante da esquerda liberal. Uma das questões, sobre o estado versus caridade como factor protector dos mais desfavorecidos, fez-me pender a balança para a esquerda ao responder que o estado, através dos regimes de segurança social, deve ser o responsável pela resolução destes problemas. Esta questão revela bem as minhas dúvidas. Apesar de ter respondido desta forma, não creio absolutamente nisto. Não acredito que a caridade, na forma como ela é habitualmente encarada (a esmola) seja uma forma correcta de resolver o problema, mas se cada indivíduo tivesse à sua volta uma estrutura familiar e de vizinhança que lhe valesse nas alturas de maiores dificuldades, muitos dos problemas de pobreza que se encontram nos países ocidentais não existiam sequer. Claro que isto seria muito bonito se não existissem muitas outras questões, relacionadas com a estrutura e dinâmica social na sua forma mais complexa, que são responsáveis pelo problema da marginalidade e pobreza, principalmente nas grandes cidades. Por isso creio que cabe ao estado agir como uma espécie de amortecedor, ao garantir a existência de equidade no acesso ao emprego, de justiça e de meios de suporte em situações de rotura. Mas não creio que isto deva retirar responsabilidade a cada um de nós, e essa responsabilidade não é exercida através da esmola dada ao pobre da esquina, mas sim cuidando de nós e dos que nos são próximos.
Ainda não sei como vou votar nas próximas eleições...
Sempre olhei para a política como um mundo obscuro e intrincado, onde a teoria das diferentes linhas ideológicas chocava com a prática da sua aplicação e com a complexidade do mundo humano, onde se inclui inevitavelmente o desejo de poder, corruptor das melhores intenções.
Creio compreender que o que separa as diferentes ideologias políticas é o conflito entre o(s) direito(s) individuais e as obrigações do indivíduo perante a sociedade em que está inserido, em que, e de uma forma necessariamente simplista, a ideologia dita de direita privilegia o valor do indivíduo, exigindo-lhe responsabilidade, enquanto a ideologia dita de esquerda privilegia o bem comum, impondo-o em desfavor das necessidades individuais. Se estou certa ou errada outros mais sabedores do que eu o poderão dizer, mas esta forma de ver as coisas simplifica-me (ou não…) a forma como entendo as questões políticas.
Como em relação a tantas outras coisas não acredito em certos ou errados absolutos. Assim sendo, e aliada à minha reiterada ignorância sobre estas questões, dou por mim frequentemente a votar em branco ou a votar inutilmente, isto é, num pequeno partido inócuo.
Depois de fazer a bússola política dou por mim colocada no quadrante da esquerda liberal. Uma das questões, sobre o estado versus caridade como factor protector dos mais desfavorecidos, fez-me pender a balança para a esquerda ao responder que o estado, através dos regimes de segurança social, deve ser o responsável pela resolução destes problemas. Esta questão revela bem as minhas dúvidas. Apesar de ter respondido desta forma, não creio absolutamente nisto. Não acredito que a caridade, na forma como ela é habitualmente encarada (a esmola) seja uma forma correcta de resolver o problema, mas se cada indivíduo tivesse à sua volta uma estrutura familiar e de vizinhança que lhe valesse nas alturas de maiores dificuldades, muitos dos problemas de pobreza que se encontram nos países ocidentais não existiam sequer. Claro que isto seria muito bonito se não existissem muitas outras questões, relacionadas com a estrutura e dinâmica social na sua forma mais complexa, que são responsáveis pelo problema da marginalidade e pobreza, principalmente nas grandes cidades. Por isso creio que cabe ao estado agir como uma espécie de amortecedor, ao garantir a existência de equidade no acesso ao emprego, de justiça e de meios de suporte em situações de rotura. Mas não creio que isto deva retirar responsabilidade a cada um de nós, e essa responsabilidade não é exercida através da esmola dada ao pobre da esquina, mas sim cuidando de nós e dos que nos são próximos.
Ainda não sei como vou votar nas próximas eleições...
quinta-feira, dezembro 09, 2004
NOVA LIGAÇÃO Inseri link para o excelente blog O Observador. Recomendo a visita!
VALHA-NOS DEUS! "O ministro de Estado, Nuno Morais Sarmento, afirma em entrevista ao "Diário Económico" que a decisão de Jorge Sampaio no sentido de dissolver o Parlamento revelou imaturidade política."
Nem sei se hei de rir, se de chorar...
Nem sei se hei de rir, se de chorar...
terça-feira, dezembro 07, 2004
ALEXANDRE Quis o acaso que hoje postasse sobre dois grandes conquistadores. Depois de Napoleão, agora é a vez do grande conquistador macedónio, Alexande.
Assisti recentemente ao filme "Alexandre, o Grande". Gostei da película, no geral, embora com algumas reservas. Creio que o argumento "passa por cima" de vários acontecimentos importantes, como as batalhas do Granico e de Isso, o cerco de Halicarnasso e de Tiro, a chegada ao Egipto, etc. Foram também negligenciados alguns aspectos importantes, como a curiosa e carinhosa relação de Alexandre com a mãe de Dário - a quem ele chamava "Grande Mãe" -, o papel de Aristóteles na sua formação (o filme dá pouca importância ao grande filósofo), e o seu casamento com a filha do Grande Rei. Creio também que o filme dá pouca importância à chamada "conspiração dos pagens", e ao papel de Filotas e Parménion no assunto. Talvez a história de Alexandre seja mais adequada a uma série televisiva, ou a uma triologia de filmes. Mas, no geral, acho que é uma película razoável.
Gostei da forma como Oliver Stone retratou Alexandre; mostrou-nos um homem brilhante e ousado, que se move pela ambição mas também por um ideal. Além disso, e ao contrário de outros cineastas no passado, Stone mostra-nos um Alexandre com dúvidas e anseios. Um Alexandre que tem medo de falhar, e que receia ter-se tornado naquilo que sempre detestou; um Alexandre que se torna paranóico, e que deixa de confiar nos que o rodeiam.
_________________________________
P.S.: foi impressão minha, ou o argumento do filme inspirou-se nos romances que Mary Renault escreveu sobre Alexandre, "Fogo do Céu" e "Jogos Funerários"?
NAPOLEÃO No editorial do “Público” do passado domingo, José Manuel Fernandes (J.M.F.) escreveu o seguinte, a respeito das comemorações do segundo centenário da coroação imperial de Napoleão Bonaparte:
"A França - e quase mais ninguém - está a comemorar a sagração de Napoleão Bonaparte como Imperador, a 2 de Dezembro de 1804. É uma celebração sui-generis, assinalada pela edição de dezenas de livros e inúmera memorablia, mas em que nalguns colocam um grão de sal: afinal o Bonaparte Imperador foi, também, o Bonaparte ditador (ver PÚBLICA). O homem que terminou com o caos pós-revolucionário com o 18 de Brumário, o general que tinha defendido a França das monarquias europeias que se sentiam ameaçadas pelo novo regime, o cônsul que presidira à elaboração do Código Civil ainda hoje celebrado em certos meios jurídicos, assumiu nesse dia poderes absolutos e exerceu-os de forma implacável. A censura, as prisões arbitrárias, a tortura e as execuções sumárias tornaram-se correntes. O sonho imperial levou-o à conquista da Europa, onde foi colocando membros da família nos diferentes tronos ao mesmo tempo que os seus homens pilhavam e arrasavam, sem piedade ou restrição. Mais: o pouco respeito que tinha pela vida dos soldados que comandava foi em crescendo até à campanha da Rússia, onde entrou à frente de 610 mil homens e de onde regressou com apenas 100 mil e a única "glória" de se ter sentado no trono do czar.
Compreender a forma ambivalente, mas ainda heróica, como os franceses celebram o último general que levou os seus exércitos à vitória - a partir de então a França não ganhou sozinha ou perdeu mesmo todas as guerras em que se envolveu, desde a de 1871 com a Prússia à da Argélia, passando pelas duas Guerras Mundiais e pela Indochina - ajuda a compreender o que é hoje aquele país e em que memórias se alicerça.
(…) Custa pois a aceitar a ambivalência com que ainda é olhado. E menos ainda a compreender a nostalgia que inspira em franceses "iluminados", como Dominique de Villepin, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e autor de um livro sobre os "Cem Dias" (o período que mediou entre o regresso da ilha de Elba e a derrota de Waterloo) que, num francês erudito e gongórico, é todo ele um exercício em torno da grandeza perdida da França."
Concordo com J.M.F. Napoleão não era flor que se cheirasse. Era autocrático, cruel, despótico e sem escrúpulos. Além de ser um magnífico estratega militar – embora se limitasse a ser um “bom aluno” dos mestres militares do século XVIII, e não propriamente um inovador (a nível teórico) -, era também um genial gestor de imagem. Napoleão soube camuflar as derrotas – no Egipto e na Península Ibérica -, e exagerar a genialidade dos seus feitos e capacidades (que eram de facto brilhantes, apesar de tudo).
Mas penso que, no quadro dos governantes e dirigentes da época, Napoleão até era dos mais humanos. Os reis absolutistas eram ainda mais cruéis, corruptos e gananciosos; os seus governos baseavam-se ainda mais no nepotismo, na bajulação e nas lutas entre camarilhas palacianas. Se Napoleão foi tão odiado naquela época, não foi por ser um tirano sanguinário – comparado com os soberanos do tempo, não era particularmente cruel -, mas sim porque tinha mais poder que todos os outros. E porque era, de facto, genial. Napoleão arriscava fazer o que ninguém tinha antes feito, e isto quer no plano militar, quer no domínio da política e dos assuntos públicos. Dotados do seu poder e génio, outros teriam sido muito mais despóticos, cruéis e sanguinários.
Há uma história que ilustra esse “lado humano” do imperador: por volta de 1809, um jovem estudante alemão atentou contra a vida de Napoleão. Detido pela guarda imperial, o jovem foi conduzido à presença de Bonaparte, que procurou descortinar e compreender as razões que levaram o jovem a atentar contra a sua vida. O imperador interrogou pessoalmente o estudante, que lhe disse estar a lutar pela libertação da sua pátria ocupada. Sensibilizado pela pureza dos ideais do jovem, Napoleão prometeu-lhe o perdão e a liberdade, se ele demonstrasse arrependimento. Mas o alemão jurou que, se Napoleão o libertasse, voltaria a atentar contra a sua vida. E só depois de muitas tentativas vãs, Napoleão desistiu de o tentar convencer, ordenando a sua execução por um pelotão de fuzilamento. Teriam Hitler ou Estaline, tiranos que J.M.F. compara a Napoleão, sequer pensado em poupar a vida daquele jovem estudante?
Convém ainda recordar que foi a Europa absolutista coligada - sob a batuta da constitucional Inglaterra - que desde cedo se virou contra a França Revolucionária. Não foi Napoleão que abriu as hostilidades. Além disso, e quer queiramos quer não, foram as suas tropas que espalharam pela Europa os ideais de liberdade e igualdade que hoje partilhamos.
___________________________
P.S.: este artigo de J.M.F. contém algumas incorrecções históricas: Napoleão não foi o “último general que levou os exércitos franceses à vitória”. J.M.F. esquece-se das muitas campanhas africanas dos séculos XIX e XX, e da guerra contra a Áustria (1859). E se é verdade que a França nunca mais venceu uma grande guerra sozinha, também o é que o mesmo se passou com as maioria das outras potências (a Guerra das Falkland constitui a excepção). Os Estados Unidos, por exemplo, apenas venceram sozinhos três guerras, em toda a sua existência como nação independente: a Segunda Guerra da Independência (1812/1814), a Guerra com o México (1848) e a Guerra Hispano Americana (1898).
"A França - e quase mais ninguém - está a comemorar a sagração de Napoleão Bonaparte como Imperador, a 2 de Dezembro de 1804. É uma celebração sui-generis, assinalada pela edição de dezenas de livros e inúmera memorablia, mas em que nalguns colocam um grão de sal: afinal o Bonaparte Imperador foi, também, o Bonaparte ditador (ver PÚBLICA). O homem que terminou com o caos pós-revolucionário com o 18 de Brumário, o general que tinha defendido a França das monarquias europeias que se sentiam ameaçadas pelo novo regime, o cônsul que presidira à elaboração do Código Civil ainda hoje celebrado em certos meios jurídicos, assumiu nesse dia poderes absolutos e exerceu-os de forma implacável. A censura, as prisões arbitrárias, a tortura e as execuções sumárias tornaram-se correntes. O sonho imperial levou-o à conquista da Europa, onde foi colocando membros da família nos diferentes tronos ao mesmo tempo que os seus homens pilhavam e arrasavam, sem piedade ou restrição. Mais: o pouco respeito que tinha pela vida dos soldados que comandava foi em crescendo até à campanha da Rússia, onde entrou à frente de 610 mil homens e de onde regressou com apenas 100 mil e a única "glória" de se ter sentado no trono do czar.
Compreender a forma ambivalente, mas ainda heróica, como os franceses celebram o último general que levou os seus exércitos à vitória - a partir de então a França não ganhou sozinha ou perdeu mesmo todas as guerras em que se envolveu, desde a de 1871 com a Prússia à da Argélia, passando pelas duas Guerras Mundiais e pela Indochina - ajuda a compreender o que é hoje aquele país e em que memórias se alicerça.
(…) Custa pois a aceitar a ambivalência com que ainda é olhado. E menos ainda a compreender a nostalgia que inspira em franceses "iluminados", como Dominique de Villepin, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e autor de um livro sobre os "Cem Dias" (o período que mediou entre o regresso da ilha de Elba e a derrota de Waterloo) que, num francês erudito e gongórico, é todo ele um exercício em torno da grandeza perdida da França."
Concordo com J.M.F. Napoleão não era flor que se cheirasse. Era autocrático, cruel, despótico e sem escrúpulos. Além de ser um magnífico estratega militar – embora se limitasse a ser um “bom aluno” dos mestres militares do século XVIII, e não propriamente um inovador (a nível teórico) -, era também um genial gestor de imagem. Napoleão soube camuflar as derrotas – no Egipto e na Península Ibérica -, e exagerar a genialidade dos seus feitos e capacidades (que eram de facto brilhantes, apesar de tudo).
Mas penso que, no quadro dos governantes e dirigentes da época, Napoleão até era dos mais humanos. Os reis absolutistas eram ainda mais cruéis, corruptos e gananciosos; os seus governos baseavam-se ainda mais no nepotismo, na bajulação e nas lutas entre camarilhas palacianas. Se Napoleão foi tão odiado naquela época, não foi por ser um tirano sanguinário – comparado com os soberanos do tempo, não era particularmente cruel -, mas sim porque tinha mais poder que todos os outros. E porque era, de facto, genial. Napoleão arriscava fazer o que ninguém tinha antes feito, e isto quer no plano militar, quer no domínio da política e dos assuntos públicos. Dotados do seu poder e génio, outros teriam sido muito mais despóticos, cruéis e sanguinários.
Há uma história que ilustra esse “lado humano” do imperador: por volta de 1809, um jovem estudante alemão atentou contra a vida de Napoleão. Detido pela guarda imperial, o jovem foi conduzido à presença de Bonaparte, que procurou descortinar e compreender as razões que levaram o jovem a atentar contra a sua vida. O imperador interrogou pessoalmente o estudante, que lhe disse estar a lutar pela libertação da sua pátria ocupada. Sensibilizado pela pureza dos ideais do jovem, Napoleão prometeu-lhe o perdão e a liberdade, se ele demonstrasse arrependimento. Mas o alemão jurou que, se Napoleão o libertasse, voltaria a atentar contra a sua vida. E só depois de muitas tentativas vãs, Napoleão desistiu de o tentar convencer, ordenando a sua execução por um pelotão de fuzilamento. Teriam Hitler ou Estaline, tiranos que J.M.F. compara a Napoleão, sequer pensado em poupar a vida daquele jovem estudante?
Convém ainda recordar que foi a Europa absolutista coligada - sob a batuta da constitucional Inglaterra - que desde cedo se virou contra a França Revolucionária. Não foi Napoleão que abriu as hostilidades. Além disso, e quer queiramos quer não, foram as suas tropas que espalharam pela Europa os ideais de liberdade e igualdade que hoje partilhamos.
___________________________
P.S.: este artigo de J.M.F. contém algumas incorrecções históricas: Napoleão não foi o “último general que levou os exércitos franceses à vitória”. J.M.F. esquece-se das muitas campanhas africanas dos séculos XIX e XX, e da guerra contra a Áustria (1859). E se é verdade que a França nunca mais venceu uma grande guerra sozinha, também o é que o mesmo se passou com as maioria das outras potências (a Guerra das Falkland constitui a excepção). Os Estados Unidos, por exemplo, apenas venceram sozinhos três guerras, em toda a sua existência como nação independente: a Segunda Guerra da Independência (1812/1814), a Guerra com o México (1848) e a Guerra Hispano Americana (1898).
quinta-feira, dezembro 02, 2004
DIA MUNDIAL DA SIDA Comemorou-se o dia mundial da SIDA. Os dias mundiais valem o que valem, isto é, muito pouco a meu ver, principalmente num dia marcado pela lufa-lufa das compras de Natal, com ordenado+13º mês já presente no banco, no lenço ou na roupa íntima (nunca viram? Eu já!).
O problema do HIV/SIDA resume-se numa palavra: ignorância. Em primeiro lugar porque a ignorância leva a comportamentos de risco, que por sua vez aumentam o número de pessoas contaminadas. Em segundo lugar porque a ignorância leva ao preconceito e à descriminação, problema que, nas palavras de alguém infectado que falou num programa que deu na 2:, se torna pior do que a doença em si. A ignorância não existe só nas aldeias recônditas, está presente em pessoas de quem se exige responsabilidade e conhecimento. Basta ver que há quem use dois pares de luvas para tratar de doentes infectados mas não tenha os cuidados necessários com materiais cortantes e perfurantes provenientes de pessoas “insuspeitas”. Contra a ignorância, educação precisa-se. Urgentemente. E já agora, façam o teste e não corram riscos. Lembrando, os riscos de contaminação provêem de contacto com sangue contaminado através de soluções de continuidade (feridas) na pele ou mucosas, através de relações sexuais sem protecção com pessoas infectadas ou transmissão transplacentária, de mãe para filho. E o mais importante, ao contrário da presunção de inocência do sistema judicial, aqui até prova em contrário qualquer pessoa está contaminada.
_____________________
Com este post inicio a minha colaboração neste blog, agradecendo ao Filipe o convite, que aceitei com muito agrado. Conforme já disse ao Filipe, espero não desiludir!
O problema do HIV/SIDA resume-se numa palavra: ignorância. Em primeiro lugar porque a ignorância leva a comportamentos de risco, que por sua vez aumentam o número de pessoas contaminadas. Em segundo lugar porque a ignorância leva ao preconceito e à descriminação, problema que, nas palavras de alguém infectado que falou num programa que deu na 2:, se torna pior do que a doença em si. A ignorância não existe só nas aldeias recônditas, está presente em pessoas de quem se exige responsabilidade e conhecimento. Basta ver que há quem use dois pares de luvas para tratar de doentes infectados mas não tenha os cuidados necessários com materiais cortantes e perfurantes provenientes de pessoas “insuspeitas”. Contra a ignorância, educação precisa-se. Urgentemente. E já agora, façam o teste e não corram riscos. Lembrando, os riscos de contaminação provêem de contacto com sangue contaminado através de soluções de continuidade (feridas) na pele ou mucosas, através de relações sexuais sem protecção com pessoas infectadas ou transmissão transplacentária, de mãe para filho. E o mais importante, ao contrário da presunção de inocência do sistema judicial, aqui até prova em contrário qualquer pessoa está contaminada.
_____________________
Com este post inicio a minha colaboração neste blog, agradecendo ao Filipe o convite, que aceitei com muito agrado. Conforme já disse ao Filipe, espero não desiludir!
O FUTURO DO PSD "O PSD é um partido com uma grande capacidade de regeneração, enquanto não for transformado numa outra coisa, no "partido geracional" que Santana Lopes deseja fazer à sua imagem e semelhança. O período que vai desde a decisão presidencial até à elaboração das listas de deputados será fundamental, porque estas listas decidirão do futuro do partido, ao definirem a massa crítica de "boa" ou "má moeda" dentro do partido.
Se nada acontecer, Santana Lopes vai continuar a ser um factor de profunda perturbação e isolamento do PSD. Se perder as eleições legislativas vai disparar para todo o lado, entrincheirar-se na vitimização e tentar fazer uma purga dentro do partido. E depois vai querer ser de novo candidato presidencial, queimando tudo à volta. Com o seu orgulho ferido pela derrota legislativa, vai querer levar tudo atrás num Gotterdammerung que pode pôr em causa o papel do PSD na sociedade portuguesa. Está escrito nas estrelas." José Pacheco Pereira, na edição de hoje do "Público"
Se nada acontecer, Santana Lopes vai continuar a ser um factor de profunda perturbação e isolamento do PSD. Se perder as eleições legislativas vai disparar para todo o lado, entrincheirar-se na vitimização e tentar fazer uma purga dentro do partido. E depois vai querer ser de novo candidato presidencial, queimando tudo à volta. Com o seu orgulho ferido pela derrota legislativa, vai querer levar tudo atrás num Gotterdammerung que pode pôr em causa o papel do PSD na sociedade portuguesa. Está escrito nas estrelas." José Pacheco Pereira, na edição de hoje do "Público"
UM ESPAÇO PLURAL Ao fim de ano e meio de existência deste blog, decidi abri-lo à colaboração de outras pessoas, enriquecendo-o com o seu contributo. Pretendo com isto que o Respublica se transforme num espaço colectivo, em que participem jovens da minha geração, universitários ou já no mercado de trabalho. Gostava que o Respublica fosse um espaço plural, continuando a abordar temas como a política, a história, o cinema e a actualidade internacional, mas também reflectindo sobre outras questões, desta feita ligadas à arte, à ciência e às letras. Com este propósito, convidei a Gabriela Soares para colaborar no Respublica, convite que a ela felizmente acedeu. E creio que dentro em breve deixará aqui o seu primeiro post. Mas novas "contratações" se auguram!