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sábado, fevereiro 07, 2004

AS GUERRAS CIVIS PORTUGUESAS (I) conforme o prometido há algumas semanas atrás, escrevo agora um post sobre os conflitos que opuseram portugueses contra portugueses, nos séculos XIX e XX. Foram anos de mudança e de confronto ideológico, que muito contribuiram para a construção do Portugal moderno. Com a ajuda deste site, esboço aqui um breve resumo dos principais conflitos, golpes de estado e rebeliões ocorridas em Portugal entre os anos de 1820 e 1868:

A Revolução Liberal (1820): Em 24 de Agosto de 1820, uma revolução militar no Porto proclamou a extinção do regime absolutista e a convocação de eleições para as Cortes Constituintes, que aprovaria a Constituição de 1822. As Cortes pediram o regresso da família real do seu exílio dourado no Brasil.

A Vila-Francada (1823): Revolta militar absolutista contra o regime liberal, ocorrida em Maio/Junho de 1823. Devido à recente independência do Brasil, um regimento revolou-se em Vila Franca de Xira, com o apoio do Infante D. Miguel, levando o rei D. João VI a pôr fim à constituição de 1822. D. Miguel foi nomeado comandante do exército, as cortes dissolvidas e o governo substituido. Menos de um ano depois, porém, a Abrilada conduziu ao exílio de D. Miguel.

A Abrilada (1824): Movimento militar organizado pela facção do Infante D. Miguel, de 20 para 30 de Abril de 1824, com o objectivo de exterminar defitivamente o liberalismo. Mas o rei D. João VI, sob forte pressão diplomática, desautorizou o filho, retirando-lhe o cargo de Comandante do Exército. A 13 de Maio, o Infante partiu para o exílio em Viena de Áustria.

A Guerra Civil entre Liberais e Absolutistas (1832/1834): Após a morte de D. João VI (10 de Março de 1826), o país ficou dividido entre os partidários de D. Pedro (filho mais velho de D. João VI e Imperador do Brasil) e de D. Miguel. D. Miguel, com o apoio dos Absolutistas, foi aclamado rei em 11/7/1828. No entanto, a oposição liberal, cujo chefe era D. Pedro, não desistia, e em Junho de 1828, dava-se uma revolução anti-miguelista em Angra, nos Açores. Em 3/3/1832 D. Pedro, tendo já abdicado do trono brasileiro, chegou aos Açores como Regente em nome da sua filha D. Maria, e dali embarcou em direcção ao continente à frente de um exército de 7500 homens, indo desenbarcar a sul do Mindelo em 8 de Julho de 1832. No dia seguinte os bravos do Mindelo ocuparam o Porto, onde passaram a suportar um longo cerco do exército miguelista. Em 20/6/1833 deu-se novo desembarque liberal, desta vez no Algarve, de um exército que avançou até Lisboa após ter vencido o exército miguelista em Cacilhas. Com outras vitórias liberais no ano de 1834, os absolutistas viram-se obrigados a aceitar a convenção de Évora-Monte. No entanto, não deixa de ser estranha a forma como D. Miguel foi derrotado: o seu exército foi talvez a maior força armada a pisar solo nacional em tempo de guerra (cerca de 80 mil homens), gozando da esmagadora vantagem de quase oito para um! Porque foram então os miguelistas derrotados? Em meu entender, por uma série de factores, entre os quais se destacam a desmoralização e má preparação das tropas, assim como a incompetência dos comandantes.

O Remexido Alcunha do guerrilheiro miguelista José Joaquim de Sousa Reis, abastado proprietário e capitão de ordenanças. A partir de 1833 chefiou a guerrilha miguelista, que prosseguiu na luta, mesmo após a Convenção de Évora-Monte. Durante anos espalhou o terror no Alentejo e no Algarve. Acabou por ser preso e fuzilado em 1838.

A Revolução de Setembro (1836): Revolução ocorrida em Lisboa após o desembarque (9/9/1836) no terreiro do Paço, dos deputados de Além-Douro eleitos para as cortes em Julho de 1836. Todos os oposicionistas radicais foram acolhidos com grandes manifestações populares, descontentes com a situação económica e financeira do país, aos quais se juntaram forças militares. Assim triunfou esta revolução pacífica, com a designação de um novo governo e o restabelecimento da Constituição de 1822.

A Belenzada (1836): Golpe de estado contra-revolucionário ocorrido em Lisboa em fins de 1836. A revolução de Setembro alarmou as cortes da Europa. Devido a esse facto, a Inglaterra fez deslocar para o Tejo a 3/11/1836, uma esquadra com tropas prontas a desembarcar, com o objectivo de proteger a família real. A rainha, reuniu os ministros na noite de 4 para 5 e demitiu o governo - era a Belenzada.

A Conspiração dos Marnotas (1837): Marnotas é uma pequena povoação nos arredores de Loures. Nela eclodiu em 14 de Maio 1837 uma revolta absolutista conhecida por "Conspiração dos Marnotas". Veteranos do exército miguelista atravessaram o Tejo e aclamaram D. Miguel em Samora Correia. Mas face acabaram por debandar face ao exército governamental, sendo alguns dos seus cabecilhas condenados à morte (1839) e outros amnistiados (1840).

Golpe de Estado de 1842: O Cartismo, facção moderada (a direita constitucional) obteve o poder. A coberto do novo regime instalou-se um ambiente de corrupção e tirania, que cedo conduziria a uma nova guerra civil. Com a Convenção do Gramido (24/6/1847), que pôs termo à Patuleia, o Cartismo desapareceu.

A Revolta da Maria da Fonte (1846): Nome dado à rebelião que pôs termo, em 1846, ao governo de Costa Cabral. Teve início em 19/3/1846, com um pequeno levantamento de mulheres, instigadas por uma tal Maria da Fonte (personagem mítica?), natural de Fonte Arcada, na Póvoa de Lanhoso, a pretexto da lei que proibia o enterramento nas igrejas. A revolta propagou-se pelo Minho, Trás-os-Montes, Beiras e Estremadura, organizando-se uma junta revoltosa em Santarém e outra no Porto. Incapaz de controlar a situação, a rainha, que sempre protegera Costa Cabral, demite o governo cabralista em 17/5/1846.

A Patuleia (1847): Episódio das lutas travadas em Portugal entre os Cartistas e os Setembristas. Deu-se o nome de patuleias aos liberais radicais, denominados Setembristas desde a revolução de 1836 que os levou ao poder. Após os levantamentos da Maria da Fonte, os Cartistas, apesar de vencidos, foram chamados a formar governo (1846). Aí, perante o descontentamento, a situação só se resolveu com a Convenção do Gramido.

A Revolta da Janeirinha (1868): Movimento político que agitou as cidades de Lisboa, Porto e Braga em Janeiro de 1868. Surgiu como protesto contra a lei de 10/6/1867, que criava o imposto de consumo. No dia 1/1/1868, ocorreu uma manifestação no Porto, facto que veio a dar origem ao título do jornal portuense "O Primeiro de Janeiro". O governo pediu a demissão, e a 7/1/1868 o novo gabinete aboliu o referido imposto.