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segunda-feira, novembro 08, 2004



SUPERIORIDADE MORAL (II) O outro argumento utilizado para demonstrar a superioridade moral e intelectual da Europa sobre os EUA, é aquele segundo o qual a primeira “aprendeu com os próprios erros”, ao contrário dos segundos. Em meu entender, este é também um argumento falacioso; em primeiro lugar, porque se alguém cometeu genocídios, oprimiu povos inteiros e destruiu civilizações milenares, esse alguém foram os países europeus. E mais: fizeram-no durante um período de tempo superior ao da própria existência dos Estados Unidos enquanto nação independente, o que significa que, de acordo com este raciocínio, os EUA têm ainda mais alguns séculos para se “emendarem” e “aprenderem com os próprios erros”.

Além disso, se nos últimos cinquenta anos os países europeus adquiriram a reputação de “bons da fita”, foi precisamente porque não tinham a força necessária para serem os “maus da fita”. Perdoem-me a análise cínica, mas a verdade é que se os países europeus não se têm metido em aventuras militares é simplesmente por duas razões: primeiro, porque têm quem faça o “trabalho sujo” por eles; segundo, porque não têm capacidade para intervir militarmente noutras partes do globo.

Devo contudo referir que não é bem verdade que os países europeus não se têm envolvido em "aventuras". Basta recordar as constantes intervenções francesas na África Negra; de tão normais e corriqueiras, nem merecem o devido destaque da imprensa europeia. Esta só fala dos malditos americanos, que querem expandir o seu império à custa dos direitos dos árabes e à revelia do "direito internacional".

Reparem na dualidade de critérios da imprensa europeia: a intervenção francesa na Costa do Marfim é descrita pela imprensa europeia com o bondoso termo de "operação de paz" (e que é, de facto, não obstante os convergentes interesses imperiais). Não interessa que o Governo legítimo da Costa do Marfim esteja contra a presença dos franceses no seu território. Reparem também que da ONU o executivo marfinense apenas recebe condenações e sanções!

Resta fazer uma comparação entre os casos da Costa do Marfim e do Iraque, país em que um governo legítimo pede a presença de forças americanas no seu território, de modo a restabelecer a ordem. Mas claro que a imprensa europeia não vê com bons olhos a presença americana (o que não deixa de ser curioso, quando a Europa é quem mais terá a perder com uma inglória retirada americana).

Em relação à "inteligência" do americano médio, não creio que esta seja mais baixa que a dos europeus. Nem mais elevada, aliás. Penso que existem tantos americanos ignorantes como europeus ignorantes. A América comete erros e pensa apenas nos seus interesses? Claro que sim, mas também a Europa. A América busca o lucro e a segurança dos seus interesses estratégicos? Claro que sim, mas também a Europa... Devemos lutar contra este estado de coisas - as opiniões públicas têm este poder, felizmente -, mas sem enveredar por crenças maniqueístas e preconceitos baseados no ódio e no ressentimento. Caso contrário, minaremos a união do Ocidente e, com ele, todas as coisas boas que a nossa civilização conquistou.

E se os media americanos têm uma visão "americo-cêntrica" do mundo, também os europeus têm uma perspectiva extremamente "euro-cêntrica". Por exemplo, provavelmente existirão tantos americanos a saber onde fica o Kosovo como europeus...

Penso que, tal como na Europa, na América existe um pouco de tudo. E à falta de estudos científicos que comprovem a "estupidez" dos Americanos, prefiro não fazer fé em preconceitos generalizados. Isso sim, seria estupidez.