respublica

segunda-feira, janeiro 24, 2005



CÍRCULOS UNINOMINAIS Com algum atraso, respondo à Laurindinha, do excelente Abrigo de Pastora que, em resposta a um comentário meu, escreveu o seguinte post:

"(...) Parece-me que o processo da criação dos círculos seria, em qualquer caso, feito com "regra e esquadro" de modo a beneficiar os partidos que aprovassem esses círculos, o que contribuiria para a descredibilização da classe política. Há também o perigo de, com os círculos uninominais, levar para o parlamento demagogos e caciques em vez de pessoas preocupadas com o interesse nacional. E há, ainda, porque a proporcionalidade entre votos e eleitos seria menor, a quase inevitalidade da exclusão da Assembleia de pequenos partidos e partidos que não privilegiam protagonismos dos seus militantes. Assim, as eventuais vantagens dos círculos uninominais seriam eclipsadas pelos efeitos políticos a que conduziriam. Idealmente, deveria ser possível criar círculos uninominais que conduzissem, nas primeiras eleições que se seguissem, a resultados semelhantes aos dos partidos com o sistema actual, mas isso não é fácil de conseguir.

Por outro lado, é gritante a evidência de que há pessoas entre os nossos concidadãos de que podemos dizer melhor do que dos partidos. Haverá forma de alcançar um justo equilíbrio?"


Julgo que já aqui exprimi a minha posição sobre os círculos uninominais. Julgo que a adopção desse sistema eleitoral permitiria uma maior ligação entre os eleitores e os deputados, assim como uma efectiva representação dos círculos por onde estes últimos são eleitos.

O sistema actual estimula a ascensão de "yes men", políticos cuja maior "virtude" será a da fidelidade canina às lideranças partidárias. Creio ser esta a principal razão de termos tão maus políticos. As eleições são vistas como "combates", para as quais os políticos se devem prontificar como "soldados", sem que tal signifique que estejam dispostos a assumir os cargos a que se candidatam, no caso de serem eleitos (o inenarrável Luís Filipe Meneses é um dos melhores exemplos dessa magnífica "tropa"). Ou seja, não existe o indispensável "contrato" entre os cidadãos e os seus representantes, uma vez que estes devem a sua lealdade aos líderes e não aos círculos que os elegem.

Penso ainda que a nomeação dos candidatos a deputado por cada partido, em cada círculo uninominal, deveria ser conseguida através de "primárias" locais. Dessa forma, o processo de escolha dos representantes de cada círculo seria o mais democrático possível.

Estou consciente, contudo, do fundamento das objecções levantadas pela Laurindinha. Realmente, a serem criados, os ditos círculos seriam pensados a "regra e esquadro" pelos estrategas dos partidos. Mas isso parece-me um mal menor. Quanto ao segundo "perigo" enunciado pela Laurindinha, o de enchermos S. Bento com "caciques" locais do género Avelino Ferreira Torres ou Fátima Felgueiras, penso que será também um risco que valerá a pena correr. Em todo o caso, o processo de escolha dos deputados será mais democrático que o actual. E convém não esquecer, além disso, que o povo não é tão "burro" como algumas pessoas pensam; esses "caciques" teriam, em todo o caso, de prestar contas pelo seu mandato. Ao contrário dos ilustres anónimos que são hoje deputados "por Viana" ou "por Viseu", esses políticos teriam de efectivamente fazer algo pelas terras que os elegeram. Ora isso seria uma forma muito mais legítima e eficaz da tão falada e necessária descentralização.

Quanto ao perigo de exclusão dos pequenos partidos, concordo com a Laurindinha; todavia, creio que, ao mesmo tempo, o sistema de círculos uninominais poderia dar uma oportunidade a esses partidos de concentrarem os seus esforços em dois ou três círculos mais importantes, conseguindo eventualmente a eleição de um ou dois deputados. Recorde-se, por exemplo, que foi desta forma que o Partido Republicano Português conseguiu eleger deputados por alguns círculos, na segunda metade do século XIX - alguns anos após a criação dos círculos uninominais (que se deu em 1859, salvo erro). Além disso, o novo sistema permitiria a eleição de independentes, o que sem dúvida seria uma refrescante lufada de ar fresco na nossa bafienta "partidocracia".

Este sistema de círculos uninominais comporta riscos, evidentemente. Mas perante a manifesta falência do actual modelo, creio que temos de arriscar inovar no sentido de conseguir uma maior aproximação entre eleitores e eleitos, bem como de democratizar o processo de escolha destes últimos. E, por consequência, melhorar a qualidade dos nossos políticos.

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P.S.: Elucidativa da falta de qualidade dos políticos actuais, é a ausência de currículo académico ou profissional da maioria dos actuais líderes partidários. Desde o tempo das "Jotas" - essas inúteis escolas de vícios -, que estes dirigentes são "profissionais" de uma actividade que não o deveria ser: a política.