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quinta-feira, janeiro 22, 2004

LAICISMO RADICAL Depois da proibição do uso de sinais religiosos nas escolas, os legisladores franceses preparam-se para impor idêntica proibição a toda a função pública. O presidente Chirac diz que “devemos viver a fé no segredo dos nossos corações”, como se fosse uma falta de educação exprimirmos as nossas crenças. Olhando para a longa história do seu país, o governo francês devia saber que dá mau resultado o Estado interferir nas questões religiosas – seja para se servir da religião, seja para a perseguir, como é o caso.

Não deixa de ser curioso que seja agora mais condenável andar com um crucifixo ao peito que vestir uma mini-saia curtíssima ou um decote ousado. Nada tenho contra quem se veste de tal modo, mas não aceito que me possam impor restrições à minha fé, enquanto que em nome dessa mesma liberdade individual que me negam, permitam que outros façam o que bem entendem. Proíbam-se as procissões públicas, dizem os laicistas radicais! Impeçam-se os padres, rabinos e imãs de sair à rua com os respectivos paramentos! Proíbam-se os miúdos de andar com crucifixos ao peito!

É natural que o véu islâmico choque as consciências ocidentais. Mas a verdade é que ninguém é obrigado a usá-lo. As muçulmanas francesas não vivem no Afeganistão ou na Arábia Saudita. Se usam o véu - e salvo situações especiais – é porque assim o querem! Perseguir a sua fé só servirá para perpetuar esta situação. O véu passará a ser visto como um símbolo da resistência ao estado opressor, a grande Babilónia perseguidora das minorias.

É uma mentalidade bem jacobina que se esconde por trás das intenções do governo (não obstante este ser de direita...). É a vontade de fazer evoluir as pessoas, como se tal fosse legítimo e possível de ser imposto pelo Estado. Aliás, como se o Estado tivesse o direito de impor como as pessoas devem viver.

A atitude do governo francês é, por isso, condenável por duas razões: primeiro, porque restringe as liberdades individuais, que devem ser sagradas e invioláveis; segundo, porque dá ainda mais força ao fundamentalismo.