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terça-feira, janeiro 20, 2004




A BATALHA DO CABO MATAPÃO foi a última grande batalha naval de importância internacional travada pelos portugueses. Em 28 de Abril de 1717, largou de Lisboa uma esquadra portuguesa composta por sete naus de guerra, dois brulotes e dois navios auxiliares, num total de 526 canhões e 3840 homens de guarnição. O seu destino era o Mar Egeu, onde se deveria reunir às esquadras veneziana, papal, florentina e maltesa, para em conjunto enfrentarem a poderosa armada turca que então ameaçava a Itália.

O Papa e a Sereníssima República de Veneza, ameaçados pelas poderosas forças do Sultão, pediram ajuda à França, Espanha e Portugal. Mas apenas D. João V respondeu ao pedido de ajuda do Pontífice, na esperança de assim conseguir títulos honoríficos para si e para o clero português.

Estrategicamente, a batalha de Matapão saldou-se por um empate entre turcos e cristãos; no entanto, a esquadra portuguesa cobriu-se de glória, tendo mesmo evitado a derrota - que possibilitaria uma eventual invasão de Itália pelos turcos - conforme se pode ler neste relato da batalha:

(...) Logo que começou a soprar a aragem de SSW é natural que Bellefontaine a tenha querido aproveitar para reorganizar a formatura, criando as condições necessárias para que toda a armada cristã pudesse tomar parte na batalha. Com esse fim é provável que tenha feito o sinal para virar em roda a fim de meter os dez navios que constituíam a retaguarda da armada no alinhamento da esquadra de Veneza, que, como foi dito, já tinha efectuado essa manobra da parte da manhã. Lentamente a São Lourenço e todas as demais naus que seguiam à frente da de Bellefontaine viraram em roda e foram colocar-se no alinhamento das naus de Veneza com a proa a SE. Mas com as naus que seguiam atrás dele as coisas passaram-se de maneira diferente. A Nossa Senhora do Pilar, almiranta de Portugal, de que era capitão Manuel de Távora da Cunha, conde de São Vicente, ou porque não tivesse compreendido o sinal, ou porque entendesse que não recebia ordens de Bellefontaine, ou muito simplesmente porque achasse que seria uma desonra afastar-se deliberadamente do inimigo, não virou de bordo, continuando em frente! As três naus portuguesas e a veneziana que navegavam nas suas águas seguiram-lhe o exemplo. Daí resultou terem ficado quatro naus portuguesas e uma veneziana isoladas a barlavento da coluna cristã, combatendo com quinze turcas!

Pela mesma altura a armada turca virou também em roda, ficando com a proa a NW, o que a fez aproximar da cristã. Reduzida a distância de tiro, embora sem permitir ainda o uso da mosquetaria, o duelo de artilharia redobrou de intensidade. Durante mais três horas a Nossa Senhora do Pilar, a Fortuna Guerreira, a Santo Rosa, a Nossa Senhora da Conceição e a Nossa Senhora da Assunção bateram-se galhardamente contra um adversário muito mais numeroso e igualmente determinado, provocando a admiração entre as guarnições dos navios que não estavam em acção. A dada altura, o conde de São Vicente, no desejo de se aproximar ainda mais do inimigo, começou a orçar, dando ideia de se querer bater sozinho com toda a armada turca! O conde de Rio Grande teve de lhe fazer sinal para regressar à formatura.

Durante esta fase da batalha, a mais intensa de todas, dada a menor distância que separava os dois adversários, é natural que tenham aumentado consideravelmente os danos e as baixas sofridos por ambos. A fim da tarde é muito provável que os principais navios turcos, em resultado dos dois combates que haviam travado anteriormente com os venezianos e do fogo nutrido que tinham feito durante todo o dia, já estivessem a lutar com falta de munições. O certo é que puxaram tudo para a orça e começaram a afastar-se para o mar. Aos olhos da armada cristã era como se estivessem a bater em retirada, corridos pelas quatro intrépidas naus portuguesas e pela sua companheira veneziana.

O grosso da armada cristã, encontrando-se no interior da enseada de Hapan com muito pouco vento não pôde, de imediato, lançar-se em perseguição dos turcos. Quando conseguiu sair dela já estes iam longe. Os navios portugueses, de um modo geral, ficaram com o aparelho muito danificado e tiveram, por junto, cerca de cinquenta mortos e cento e cinquenta feridos. Os danos e as baixas sofridos pelas duas naus de Malta devem ter sido menores, uma vez que estiveram durante menos tempo envolvidas em combate. Os navios venezianos pouco ou nada devem ter sofrido. Quanto aos turcos, constou que tinham tido um navio afundado pelo tiro da artilharia e outro incendiado por acidente, o que não é confirmado pelas testemunhas oculares. Disse-se também que tinham sofrido para cima de seis mil mortos, o que parece francamente exagerado. O mais natural é que tenham sofrido danos e baixas sensivelmente iguais aos dos cristãos. (...) Sob o ponto de vista estratégico, a batalha do cabo Matapão não teve qualquer repercussão sobre o desenrolar da guerra, continuando os Turcos, como anteriormente, senhores absolutos do mar Egeu."


Desde então, armada portuguesa não voltou a participar em combates desta importância, nem a desempenhar um papel tão decisivo no desenrolar de um conflito, próprio de uma grande potência marítima.

A título de curiosidade, refira-se que, graças ao nosso honroso desempenho em Matapão, D. João V foi agraciado pelo Papa com o título de "Majestade Fidelíssima" e o bispo de Lisboa recebeu o de Patriarca.