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terça-feira, março 22, 2005



ESCREVER A HISTÓRIA A biblioteca da minha universidade contém no seu espólio verdadeiras preciosidades. Exemplo disso é um pequeno livro que lá encontrei recentemente, intitulado “O Grande Feito do Povo Soviético e do Seu Exército”.

Publicado em 1983, o livro narra a história daquilo que os Russos chamam a “Grande Guerra Pátria”, ou seja, a Segunda Guerra Mundial. Da autoria de um tal V. Riabov, Tenente-General do Exército Vermelho, “O Grande Feito do Povo Soviético e do Seu Exército” serve-se da linguagem típica da propaganda soviética da Guerra Fria.

Como documento científico, o livro tem pouco valor: os números são grosseiramente deturpados e muitos factos são omitidos. O regime estalinista é desavergonhadamente glorificado, ao passo que as democracias ocidentais são vistas como quase cúmplices de Hitler. Por exemplo, o Pacto de Não-Agressão assinado entre a Alemanha Nazi e a URSS é apresentado como uma resposta à “traição” do Ocidente, ao mesmo tempo que a partilha da Polónia entre os dois regimes totalitários nem chega a ser referida.

Mas a verdadeira importância deste “O Grande Feito do Povo Soviético e do Seu Exército” reside no facto de nos permitir constatar como, sob a designação de “História” e em nome da ditadura do proletariado, se escreviam e publicavam os maiores disparates. Senão vejamos algumas passagens do livro:

“A fidelidade à política de paz é o traço característico da actividade do Estado Soviético desde a sua fundação, em Outubro de 1917” (pág. 29)

“Como se sabe, no começo de Agosto [de 1945] a aviação americana lançou duas bombas atómicas sobre a população das cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki. Este bárbaro acto que visava amedrontar os povos não desempenhou grande papel na derrota do Japão, que continuou a guerra. Só o fulminante desbaratamento pelas tropas soviéticas das principais forças do exército nipónico na Manchúria obrigou os círculos governantes do Japão a assinar, a 2 de Setembro de 1945, o acto de capitulação inteira e incondicional.” (pág. 165)

“Nisto [na vitória sobre a Alemanha] se revelou plenamente a superioridade da economia socialista planificada (…)” (pág. 177)

“No Ocidente são difundidas fábulas segundo as quais sem a ajuda técnico-material dos EUA e da Inglaterra a União Soviética não teria podido resistir à invasão nazi-fascista. Pura invenção!” (pág. 178)