VELHOS ESCRITOS (II) A respeito dos "populares" que têm apupado o principal suspeito do homicídio da pequena Joana, recordo um texto que aqui postei em Outubro do ano passado:
"OS "POPULARES" que vão ao tribunal da Boa Hora apupar e insultar Carlos Silvino, são os herdeiros directos das multidões que na Idade Média assistiam deliciadas ao suplício dos condenados.
Mais do que simples castigos, as execuções públicas eram demonstrações do poder real. Fazendo uso de uma variadíssima gama de torturas, os carrascos medievais puniam os criminosos perante multidões entusiastas. Os dias de execuções eram de festa; milhares de visitantes acorriam às vilas e cidades onde estas tinham lugar, levando consigo centenas de vendedores ambulantes.
A multidão aplaudia a actuação do carrasco, sempre que este desempenhava "bem" a sua função. Ao mesmo tempo, existem relatos de multidões enfurecidas que trucidaram carrascos incompetentes. Simultaneamente executor e entertainer, o carrasco era responsável pelo apaziguamento dos demónios colectivos.
A multidão apupa o condenado porque este carrega sobre si o pecado colectivo; toda a gente em Lisboa sabia que os miúdos da Casa Pia se prostituíam no Parque Eduardo VII, mas nunca ninguém se importou. Todos, incluindo políticos, polícias, responsáveis da instituição e vulgares cidadãos, eram conhecedores da pouca vergonha que ali se passava. Mas ninguém fez nada. E dai que o Zé Povinho, desejoso de remir essa culpa e esquecer o sombrio passado do qual foi cúmplice por omissão, queira agora vexar e punir os responsáveis directos pelos crimes. É a única forma de ficar com a consciência tranquila.
Aqueles que vão à Boa Hora com o propósito de apupar "Bibi" fazem-no tanto por compaixão pelas vítimas como por má consciência."
"OS "POPULARES" que vão ao tribunal da Boa Hora apupar e insultar Carlos Silvino, são os herdeiros directos das multidões que na Idade Média assistiam deliciadas ao suplício dos condenados.
Mais do que simples castigos, as execuções públicas eram demonstrações do poder real. Fazendo uso de uma variadíssima gama de torturas, os carrascos medievais puniam os criminosos perante multidões entusiastas. Os dias de execuções eram de festa; milhares de visitantes acorriam às vilas e cidades onde estas tinham lugar, levando consigo centenas de vendedores ambulantes.
A multidão aplaudia a actuação do carrasco, sempre que este desempenhava "bem" a sua função. Ao mesmo tempo, existem relatos de multidões enfurecidas que trucidaram carrascos incompetentes. Simultaneamente executor e entertainer, o carrasco era responsável pelo apaziguamento dos demónios colectivos.
A multidão apupa o condenado porque este carrega sobre si o pecado colectivo; toda a gente em Lisboa sabia que os miúdos da Casa Pia se prostituíam no Parque Eduardo VII, mas nunca ninguém se importou. Todos, incluindo políticos, polícias, responsáveis da instituição e vulgares cidadãos, eram conhecedores da pouca vergonha que ali se passava. Mas ninguém fez nada. E dai que o Zé Povinho, desejoso de remir essa culpa e esquecer o sombrio passado do qual foi cúmplice por omissão, queira agora vexar e punir os responsáveis directos pelos crimes. É a única forma de ficar com a consciência tranquila.
Aqueles que vão à Boa Hora com o propósito de apupar "Bibi" fazem-no tanto por compaixão pelas vítimas como por má consciência."
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