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quinta-feira, julho 03, 2003

O papel da Europa na Nova Ordem Mundial: Eu, federalista, me confesso!

Estou desiludido com a anunciada Constituição Europeia. Parece ter sido feita para agradar a gregos e a troianos! Além disso, os convencionais são obrigados a lidar com polémicas menores e mesquinhices que não lembram ao diabo! Como resultado disso, teremos uma constituição europeia ambígua e dada a interpretações dúbias, quando o que se queria era sintetisar ao máximo o "tecido" jurídico comunitário.

Federalismo versus Directório

Sou federalista. Acredito que a Europa deve ocupar uma posição política e militar adequada ao seu poder comercial e económico. Creio também que o federalismo é a melhor solução para países como Portugal; somos aquilo a que se chama uma "potência média" na Europa (e não um "país pequeno", como muitos julgam), a quem o federalismo garante a defesa dos seus interesses. Ao contrário do que muitos pensam, a maior ameaça à nossa independência nacional provém da instituição de um directório dos grandes e não da criação de uma confederação de estados-nação em que os direitos e prerrogativas dos estados estejam bem defendidas. E reparem que digo confederação de estados-nação e não federação.

Bem sei que será muito difícil caminhar nesse sentido, e por uma simples razão: as grandes potências (R.U., França e Alemanha) só aceitarão uma perda da sua importância mundial em detrimento da União Europeia se forem elas a conduzi-la. Enquanto funcionou o "motor" da Europa, através do eixo Paris-Bona, interessava aos franceses e aos alemães a criação de uma federação por si dirigida. Eram eles que condiziam, logo, não perdiam nada. O problema foi quando Blair entrou no "jogo" europeu, depois do afastamento voluntário do britânicos no tempo dos governos Tatcher e Major; aos ingleses não interessa uma Europa Federal, mas sim uma comunidade económica onde possam exercer a sua influência mercê de alianças estratégicas com países como Portugal, a Alemanha, a Holanda, a Itália e os países que entrarão para a UE em 2004. Quanto mais influência tiverem no contexto europeu, mais importância terão aos olhos de Washington, o que é o mesmo que dizer no resto do mundo.

A defesa europeia

É curioso ver como os principais anti-americanistas são também os maiores opositores ao aumento do investimento na defesa, por parte dos países europeus. São contra o imperialismo americano, mas ao mesmo tempo são contra o reforço da posição diplomático-militar da Europa. É impossível ter peso diplomático sem força militar. É uma regra básica da política internacional. Além de que o nosso atraso em relação aos EUA pode pôr em causa a própria sobrevivência dos países europeus; o que acontecerá quando os americanos deixarem de nos defender? A resposta é simples: seremos presa fácil dos nossos vizinhos asiáticos e mesmo norte-africanos... acham que exagero? Basta recordar que a história da Europa foi toda ela feita de invasões vindas de Leste e Sul. E que daqui a 100 anos o panorama estratégico será muito diferente. É pela segurança dos nossos netos que temos de investir na defesa. Antes que seja tarde demais.

Para terem uma ideia das carências europeias em termos de defesa, basta lembrar o seguinte:

- a percentagem do PIB europeu investido na defesa é metade da percentagem investida pelos EUA.

- os países europeus têm uma capacidade de projecção de forças extremamente reduzida. O próprio R.U., que juntamente com a França é a maior potência militar da Europa Ocidental, precisa de fretar vôos charter para transporte de tropas e materiais. Os países europeus teriam mesmo dificuldade em intervir no seu próprio continente, como ficou provado pelas intervenções na Bósnia e no Kosovo.

- Temos um atraso de 30 anos em relação aos EUA, em termos de investigação e investimento em novas tecnologias.

- Alguns especialistas calculam que bastava um aumento de 1% do IVA para que os países europeus pudessem investir na defesa em termos satisfatórios que permitam, dentro de 15 ou 20 anos, tratar os EUA numa relação de igualdade. No entanto, não existe vontade política para fazer aquilo que tem de ser feito!


Ninguém gosta da guerra nem quer a guerra. Mas para a evitar, temos que ter capacidade de dissuadir todos os eventuais inimigos. A máxima romana "Si vis pacem, para bellum", aplica-se hoje mais que nunca. E repito que se os EUA têm hoje um poderio desmesurado que lhes permite fazer tábua rasa dos organismos internacionais e agir unilateralmente, é por desleixo dos europeus. Não adianta nada chorar e protestar contra as intervenções americanas se não fizermos o mais importante: adquirir força diplomática mercê de um investimento redobrado na defesa, que nos permita a construção de um mundo multipolar e equilibrado.

A importância da relação transatlântica

Temos de ter a consciência que a "Europa Potência" nunca poderá sê-lo numa relação de rivalidade com os EUA. A estabilidade do mundo depende da aliança entre a Europa e a América, para não dizer que precisamos tanto deles a nível económico, como eles de nós. E uma relação entre iguais só se consegue com igualdade de forças.