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sexta-feira, janeiro 16, 2004




A MULHER VISTA PELOS MEDIA O Salto Alto, blog "com interesses no feminino", tem reflectido sobre a forma como os media falam das mulheres, como espelho da importância que elas possuem na nossa sociedade. Um post de Joana Pinto, minha estimada colega de curso, chamou-me a atenção por referir que "(...) as mulheres são muitas vezes notícia em Portugal, embora por motivos que maioritariamente lhes conferem uma imagem negativa. É raro ser uma mulher a ganhar um Prémio Nobel ou a ser reconhecida por ter construído por exemplo alguma coisa importante, mas é bastante comum ler-se num jornal, numa revista, numa publicação on-line, assistir-se na televisão ou ouvir-se na rádio notícias sobre prostituição feminina, mães solteiras, violações ou violência doméstica, entre muitas outras". Concordo plenamente. E a articulista prossegue, afirmando: "Sem me querer contradizer, devo salientar que a mulher não é abordada pelos Media de uma forma exclusivamente negativa. No entanto, é necessário frisar que a maioria das notícias que dão voz ao sexo feminino são depreciativas para esse mesmo sexo. Não sei se será necessário mudar a forma como se escreve sobre as mulheres, mas penso que uma mudança de atitudes dentro da nossa sociedade, na forma como estas são tratadas, poderá ajudar nos substancialmente a ter outra visão deste sexo e isso levará progressivamente a outras formas de escrita sobre o "sexo fraco", que afinal tem muita força". De facto, todas as formas de violência e discriminação contra as mulheres são deploráveis e inaceitáveis numa sociedade democrática, e como tal devem ser combatidas.

Mas a questão que agora coloco é outra, com base nesta afirmação da Joana: "(...) não sei se será necessário mudar a forma como se escreve sobre as mulheres". Deveria existir discriminação positiva a favor das mulheres, no discurso dos media? Deveriam estes procurar evitar passar esta imagem "depreciativa" das mulheres?

Em minha opinião, não. E por duas razões: primeiro, por duvidar da eficácia das chamadas medidas de discriminação positiva. Segundo, por não considerar legítimo que os media "embelezem" propositadamente a realidade. Embora reconheça que os jornalistas não são meros mensageiros, não acredito no jornalismo de causas, por mais justas que estas sejam.

Não acredito na eficácia das medidas de discriminação positiva, independentemente do contexto em que sejam postas em prática. Penso que, na verdade, acabam por perpetuar e escamotear as situações de desigualdade que seria suposto combaterem. Por exemplo, as quotas mínimas obrigatórias para mulheres nas listas candidatas à Assembleia da República não se traduzem num aumento da participação das mulheres na vida política, quando sabemos que as chefias partidárias escolhem apenas as candidatas que lhes convém. Podem existir mais mulheres no Parlamento, mas existirão melhores mulheres? Ou melhores pessoas? Neste caso concreto, e recorrendo ao exemplo referido pela Joana do facto de existirem poucas mulheres que tenham recebido o prémio Nobel, seria justo e apropriado que os media dessem mais atenção a uma mulher agraciada com o dito prémio - pelo simples facto de ser mulher - que a um cientista homem que, por exemplo, descobrisse a cura contra a SIDA?

O Jornalismo e Comunicação citou recentemente um artigo de José Vítor Malheiros, segundo o qual "os jornalistas não são mensageiros porque o seu papel não consiste em transportar de um lugar para outro - das folhas de um processo para as páginas de um jornal, por exemplo - uma dada mensagem. Um jornalista não é um estafeta reduzido a um papel de mero transporte, nem um pé de microfone. (...) os jornalistas, sendo mediadores porque estabelecem uma mediação entre leitores e sociedade, são produtores de informação e possuem o dever de escolher, filtrar e validar as notícias que dão - a partir da informação que recolhem activamente ou que recebem passivamente - e até de traduzir, descodificar, explicar, enquadrar ou mesmo comentar as notícias que o exijam. São os autores das notícias".

Embora não seja ninguém para concordar ou discordar com o cronista - sou apenas um estudante de comunicação! - devo dizer que sim, que penso de igual forma. No entanto, o facto de os jornalistas não serem meros mensageiros, e de fazer parte das suas funções a selecção, validação e explicação das notícias, não significa que devam escolher as notícias em função de determinados objectivos políticos ou ideológicos, como sejam, neste caso, a melhoria da imagem das mulheres aos olhos do público.

Creio que o jornalismo deve estar apenas comprometido com duas ideias chave: dizer a verdade (ainda que isso signifique falar de temas incómodos e depreciativos), e a defesa do sistema democrático, sem o qual o próprio jornalismo perderia a sua razão de ser.