O CASTIGO DOS PARRICIDAS A sociedade romana era, como sabemos, de molde patriarcal. O Pater Familias era detentor de poder de vida ou de morte sobre os membros não emancipados da sua família: esposas, filhos menores, filhas solteiras, mães viúvas e outras pessoas que lhe fossem confiadas (filhos adoptivos, por exemplo). A lei consagrava o respeito pela figura paterna, no que influíam aspectos religiosos importantes. Para os Romanos, o parricídio era o crime mais horrendo que alguém podia cometer: mais que uma ofensa às leis dos homens, era considerado um ultraje aos deuses. Por exemplo, é curioso verificar que mesmo os piores facínoras da história romana respeitaram a vida dos respectivos pais (dos pais, não das mães; Nero, por exemplo, matou Agripina, ao que dizem para poder contemplar as entranhas que o conceberam...). Ao contrário dos soberanos persas, partos, egípcios ou gregos, nunca um imperador romano ascendeu ao trono assassinando o pai. Houve rumores, é certo, a respeito de imperadores como Domiciano ou Caracala, por exemplo, mas nada ficou provado.
O castigo para os parricidas era exemplar, tendo sido estipulado nos primórdios da república romana (ou mesmo no tempo da monarquia). O castigo do parricida destinava-se a exprimir a ira do pai Júpiter contra o filho que ousa assassinar aquele que transporta a semente que lhe deu vida. Era, por isso, uma pena estipulada por sacerdotes e não por legisladores.
Mas que castigo era esse? Era um suplício particularmente cruel, mesmo para os padrões da época. A lei estipulava o seguinte: imediatamente após a sua condenação pelo tribunal, o parricida era conduzido para fora dos muros da cidade, para o Campo de Marte. A população era depois convocada para assistir ao suplício, através do toque de trombetas por toda a Roma.
Eram colocados dois pedestais à altura dos joelhos do parricida; este, já completamente despido, punha um pé em cada pedestal, ficando acocorado e com as mãos presas atrás das costas. Deste modo, todas as partes do seu corpo nú ficavam acessíveis aos carrascos, que o chicoteavam com látegos cheios de nós, até o sangue jorrar como água... significava isto que o sangue que lhe corria do corpo era o mesmo que correu nas veias do seu pai e lhe deu a vida. Ao vê-lo jorrar, o parricida compreendia o desperdício que o seu crime produziu... e o sacrilégio que era ofender a origem da própria vida.
Quanto os carrascos terminavam o seu trabalho – ou seja, quando todo o corpo do parricida estivesse completamente dilacerado – o condenado era obrigado a rastejar para dentro de um saco de peles estreitamente cozidas, de forma a não deixar entrar água nem ar. Se recusasse, os tormentos recomeçariam. E como o saco estava colocado a vários metros dos pedestais, a populaça tinha oportunidade de insultar o parricida e de o cobrir com excrementos enquanto ele se arrastava.
Uma vez dentro do saco, o parricida estava assim devolvido ao ventre materno, tornado não nado, não nascido. Eram depois colocados no saco quatro animais, que deveriam continuar a atormentar o condenado: um galo e um cão, símbolos protectores do lar, que falharam na missão de proteger o pater familias; uma serpente, princípio masculino que tanto pode dar a vida como a morte; e, finalmente, um macaco, a mais cruel paródia de humanidade feita pelos deuses.
O saco era depois hermeticamente fechado e lançado ao Tibre; vigilantes eram colocados ao longo do rio, desde Roma até Óstia, de modo a que o saco não desse à margem. Uma vez no mar alto, o supliciado era entregue de Júpiter a Neptuno, e deste último a Plutão. Estava para além do cuidado e da memória, longe da vida que desprezara e ultrajara. A morte, que tanto podia demorar apenas alguns minutos como várias semanas, seria agora uma libertação.
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