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sexta-feira, dezembro 05, 2003




JORNALISMO E MANIPULAÇÃO Encontrei este artigo num site brasileiro. Embora se trate de uma realidade diferente da nossa, identifico-me com alguns dos pontos de vista do autor (wladymir ungaretti), nomeadamente do que diz respeito à formação cultural dos futuros jornalistas:


"Todas as vezes que ouvi falar em melhoria da qualidade de ensino, pelo menos tem sido assim na área dos cursos de jornalismo, acabei presenciando o aumento dos mecanismos burocráticos - voltados para viciar e punir. A estrutura se reorganiza, sobre a alegação da necessidade de aperfeiçoar os mecanismos de transmissão de conhecimento e, na verdade, institui formas mais "democráticas" de domesticar os alunos e, eventualmente, professores rebeldes. O objetivo é sempre o mesmo: estabelecer o máximo de diferenças entre os bons e os maus. Acentuar a imagem negativa dos problemáticos. Recompensar os considerados bons. Por isso mesmo, todo processo de "melhoria da qualidade" vem acompanhado de sistemas mais sofisticados de avaliação dos alunos e professores. Decorrência lógica é a crescente supervalorização da capacidade de decoreba em detrimento de qualquer-iniciativa-criativa-descontrolada.

Os bons alunos são valorizados e até premiados pelos professores doutores. E, em relação aos maus alunos, a idéia é sempre a de enquadra-los. Quando a rebeldia é demais o indicado é acachapá-los. Em meio a estes mecanismos "educativos" e/ou com parte deles é preciso estimular uma "rebeldia light". Coisa para "inglês ver".

Em tempos de neoliberalismo - que de neo não tem nada - o sistema de educação superior está todo voltado para uma velha idéia produtivista que abarca professores e alunos numa obsessiva competição. É o discurso da eficiência. Não por acaso, as exigências de titulação e a necessidade de resultados é fundamental. Acabou o espaço para os "incapazes".

Os verdadeiros críticos estão amarrados por uma montanha de normas e diretrizes burocráticas. Também são obrigados a serem instrumentos do processo de submissão, cujo objetivo final é impor a ordem e a obediência. Em lugar do prazer pelo estudo e por trabalhar em sala de aula é preciso cumprir os mecanismos de soma de pontos, com o aumento de títulos e dos "trabalhinhos de pesquisa". A sala de aula passa a representar um mal necessário. Dar boas aulas não conta pontos.

Reafirmo: o ensino de Jornalismo está em crise. Os cursos são a reprodução dos preceitos morais e ideológicos de uma sociedade em crise global. Alunos e professores, impregnados pelos valores do individualismo e da competição, são elementos essenciais para a manutenção dos mecanismos de alienação da realidade. De manipulação. O que vale é a autoridade e não a liberdade. O saber criativo é esmagado pela pedagogia dos burocratas. O professor crítico vive na corda bamba. De um lado estudantes pragmáticos ansiosos pelo ingresso no mercado. De outro lado, a pressão dos professores-policiais-censores. Manter um discurso coerente e uma prática correspondente é quase impossível.

(...) O que continua sendo absolutamente essencial para o exercício da profissão de jornalista? Continua sendo necessário que tal profissional tenha uma ampla “enciclopédia", o que significa ter uma sólida formação cultural. E, é claro, um grande amor pela Língua Portuguesa. As técnicas dos diversos meios (jornal, rádio, tv, e nos tempos atuais, jornalismo on line) são de uma gama imensa de variações. É evidente que existem especificidades, tanto da técnica em relação a cada um desses meios, como até mesmo no campo interno de cada um deles. Redigir para o jornal O Globo não é o mesmo que redigir para o JB, assim como não são idênticas as técnicas de redação nas diversas emissoras de rádio e/ou TV.

Quando passei pela faculdade, na condição de estudante, não havia laboratório fotográfico, estúdio de rádio ou tv, e nem por isso saíamos da faculdade sem as condições para o exercício da profissão. Tínhamos uma formação de cidadania muito mais sólida do que os atuais profissionais entregues ao Deus-mercado. Qualquer estudante de Jornalismo, com boa formação cultural, com um domínio da Língua Portuguesa, está preparado para trabalhar em qualquer veículo de comunicação. O conhecimento de aspectos técnicos do meio ou do veículo específico se dá de forma natural."